quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

NO VERMELHO

Editorial Folha de S.Paulo
Em meio a notícias favoráveis na economia nos últimos meses, chama atenção a piora no resultado das contas externas brasileiras. Mesmo com a recuperação ainda cambaleante, houve sensível aumento do déficit no conjunto das transações com o resto do mundo. 
O rombo no ano passado chegou a US$ 50,8 bilhões (2,8% do PIB), um salto de US$ 9,2 bilhões frente a 2018 e o maior nível em quatro anos. O risco é que uma retomada maior, no contexto de baixa poupança doméstica, esbarre em limitações de financiamento.
No passado, déficits acima de 4% do PIB sempre acenderam alertas por expor o país aos humores do capital internacional. 
Embora não haja risco relevante de crise cambial, em função do tamanho das reservas internacionais e do baixo endividamento externo do setor privado, os dados mais recentes sinalizam um quadro menos favorável. 
A deterioração nas contas decorre primordialmente da piora do saldo da balança comercial, de US$ 53 bilhões para US$ 39,4 bilhões no período, causada pela queda das exportações. Apenas para a Argentina, o principal mercado para produtos industriais, houve retração de 35% nas vendas brasileiras. 
Não se espera uma repetição do mau desempenho neste ano, mas tampouco há sinais de melhoria no desempenho do parceiro do Mercosul. Há riscos também no comércio com a China, principal parceiro comercial do país, cujo acordo com os Estados Unidos prevê sensível aumento de compra de produtos agrícolas americanos.
Do lado do financiamento, ao menos, as condições são mais favoráveis. Continua o padrão de aportes de investimentos diretos, mais do que suficientes para cobrir o déficit e com a vantagem de serem referenciados na moeda nacional. 
Seja como for, a piora das contas é um lembrete oportuno de problemas estruturais. O país não consegue fazer crescer as exportações e padece de baixa competitividade em praticamente todos os setores. 
A letargia persistente da indústria e a ausência de reação das vendas externas, mesmo após a significativa desvalorização do real nos últimos anos, mostram que o problema não é de fácil resolução. 
Além de reformas que induzam ao aumento da poupança interna, será preciso persistir em iniciativas de impacto sistêmico, como simplificação tributária, abertura ao comércio e investimentos em qualificação de mão de obra.
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