As perspectivas da economia brasileira parecem, hoje, bem
mais auspiciosas do que em janeiro do ano passado. Inflação sob estrito
controle permitiu que o Banco Central, afinal, conduzisse a economia brasileira
à fabulosa terra incognita das taxas reais de juros efetivamente baixas. A
recuperação mais rápida do nível de atividade parece estar a caminho. Nada
espetacular, mas o suficiente para que a taxa de crescimento do PIB em 2020
seja o dobro da observada em 2019.
A consolidação fiscal tornou-se mais crível, na esteira da
aprovação da reforma da Previdência e das propostas de medidas complementares
requeridas para manter o teto de gastos em vigor. A combinação de taxas de
juros baixas, crescimento mais rápido e redução do déficit primário vem
tornando a dinâmica do endividamento público bem menos adversa do que parecia.
Mas a melhora do quadro fiscal tem de ser entendida com
percepção clara das qualificações pertinentes. Não deve dar lugar a ilusões
infundadas. O jogo ainda está longe de estar ganho. Boa parte do esforço de
ajuste fiscal que se faz necessário ainda está por ser feito.
Não foi uma decisão sábia dispersar, em três Propostas de
Emendas à Constituição (PECs), as medidas complementares de ajuste fiscal
contempladas pela equipe econômica. A tramitação de três PECs simultâneas, em
ano de eleições municipais, já parece bem mais do que o precário esquema de
articulação do governo com o Congresso dará conta de entregar. Mas há ainda muito
mais em jogo no Congresso, na batalha pela preservação do teto de gastos.
O agravamento da crise fiscal dos governos subnacionais tem
dado lugar a pressões políticas cada vez maiores por formas variadas de resgate
federal. Chegou a conta do equívoco de ter deixado estados e municípios de fora
da reforma da Previdência. A chamada PEC Paralela, que supostamente sanaria
parte desse equívoco, sofreu deformações sérias no Senado que teriam de ser
devidamente recompostas na Câmara. Descrentes do que ainda poderá vir do
Congresso, vários estados, cada um a seu modo, vêm tentando aprovar reformas de
seus sistemas previdenciários, sob cerrada oposição.
O governo terá ainda de zelar pela tramitação de outros
projetos de sua iniciativa, como o controvertido programa de fomento ao emprego
e a proposta de reforma tributária que prometeu submeter ao Legislativo em
fevereiro. E terá também novos desatinos fiscais a enfrentar. A precariedade da
articulação do governo com o Congresso não só limita sua capacidade de assegurar
a aprovação das medidas fiscais propostas, mas também lhe deixa sem capacidade
de bloqueio de iniciativas parlamentares irresponsáveis, na contramão do ajuste
fiscal necessário.
Mas, mesmo tendo em conta todas essas dificuldades, é
inegável que o delicado círculo virtuoso que vem ganhando força na economia,
desde 2016, afigura-se agora bem mais promissor. Com a aceleração do
crescimento que, enfim, parece estar a caminho, o governo está prestes a se
livrar de um ponto crucial de tensão na condução da política econômica, que era
a impaciência com a demora da retomada.
A questão, agora, é em que medida será possível atenuar o
principal ponto de tensão remanescente, que é o desgaste político decorrente do
aperto fiscal progressivo, envolvido na compressão sem fim das despesas
discricionárias. No melhor cenário, o sucesso do esforço de ajuste fiscal em
2020 abriria espaço para que o teto de gastos pudesse ser mantido em vigor por
um período prolongado. No pior, a manutenção da contenção requerida de despesas
ficaria politicamente inviável, e o governo seria forçado a promover um
temerário “aperfeiçoamento” do teto de gastos. Num cenário intermediário, o
governo, com algum desgaste, pelo menos conseguiria manter crível o respeito ao
teto ao longo do atual mandato presidencial.
Tudo isso, claro, na presunção, um tanto heroica, de que
possam ser mantidas sob relativo controle as forças desestabilizadoras que
continuam a emanar do Planalto e do hipertrofiado lado aloprado do governo.
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