É a mesma história, a quitanda abre tarde, sem berinjelas
para vender, nem troco para a freguesa. Não bastassem as filas do INSS, o
governo conseguiu azucrinar a vida da garotada que fez o exame no Enem e viu-se
tungada nas notas. Aos aposentados disseram que fila é “estoque” e atraso é
“empoçamento”. Aos estudantes dizem que erro nas notas é “inconsistência” e que
o Inep “imediatamente adotou medidas”. A primeira afirmativa é empulhação, a
segunda, mentira.
O vestibular sempre foi uma crueldade imposta aos jovens
brasileiros. Em duas manhãs eles são obrigados a jogar um ano de vida, bem como
suas expectativas pessoais e de seus familiares. Desde 2009 acontecem desgraças
nesse exame. Num ano houve o furto de provas na gráfica, em três outros
comprovaram-se vazamentos de questões. O que aconteceu com o exame de 2019 foi
coisa inédita: erraram nas notas dadas a estudantes e em dois dias foram da
onipotência à mistificação.
Aos fatos:
Vitor Brumano, 19 anos, candidato a uma vaga num curso de
Engenharia, viu que sua nota não conferia. Tentou se queixar, mas não havia
onde. Ligou para um 0800, e a atendente lhe disse que era isso mesmo. Registrou
sua reclamação junto à Ouvidoria do Inep e recebeu a seguinte resposta:
“O edital que regulamenta o exame não prevê a possibilidade
de recorrer da nota, pois o desempenho do participante na prova objetiva é
calculado com base na TRI, a prova do Enem tem 180 questões objetivas.
Portanto, a média não é exatamente proporcional à quantidade de acertos porque
as perguntas têm grau de dificuldade diferente”. Conversa de educateca.
Vitor criou um grupo no WhatsApp. Começou com sete jovens
tungados e em poucos dias teve dois mil comentários.
No sábado, o ministro da Educassão, Abraham Weintraub, disse
que “nós encontramos algumas inconsistências na contabilização da segunda prova
do Enem. (…) Um grupo muito pequeno de pessoas teve o gabarito trocado. (…)
Estamos falando de 0,1%”. Conta outra, doutor, foram pelo menos seis mil
jovens, e nenhum deles seria lesado em 0,1% de seu desempenho mas, em muitos
casos, em 100%.
Weintraub sabe o que é ralar como estudante. Em 1989 ele
estava no primeiro ano de Economia na USP e tomou quatro zeros. Como ministro,
explicou-se: “Foi um inferno. Meus pais se separaram, teve o Plano Collor,
minha família desmanchou, eu tive depressão e sofri um acidente horroroso que
eu tive que colocar um parafuso no braço.” O inferno do jovem Weintraub derivou
de circunstância pessoais. O inferno da garotada do Enem de 2019 derivou da
incompetência, agravada pela arrogância de seus educatecas. Se jovens como
Vitor Brumano não tivessem botado a boca no mundo e se não existisse o tambor
das redes sociais, eles seriam jogados num estoque empoçado de estudantes
reclamões.
Jair Bolsonaro e Weintraub sempre trataram o Enem como uma
questão ideológica. Que seja, mas como diz o seu nome, é um exame. Quem quiser,
pode travar uma guerra cultural em torno dos tipos de berinjelas. Afinal, entre
outras, há as italianas e as chinesas (comunistas e globalistas). Acima das
ideologias, vale a lei do professor Delfim Netto: A quitanda do governo tem que
abrir cedo, com berinjelas para vender e troco para a freguesa.
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