É possível que um quadro epidêmico mais grave no Brasil não
pudesse ser evitado, a julgar pelo que ocorre no mundo. No entanto, não restam
dúvidas que o governo federal demorou a agir, podendo implicar em maiores
custos, em vidas e na economia.
O mercado financeiro reage à piora do quadro doméstico.
Estancar perdas não é para já.
No dia 23 de janeiro, o ministro da Saúde afirmou que o País
estava em nível 1 de alerta, em uma escala de 1 a 3. Risco iminente. Mesmo com
a aproximação do carnaval, não houve comunicação em massa sobre os cuidados
mínimos dos indivíduos e medidas sanitárias efetivas nas fronteiras.
Somente após quase dois meses desde o alerta de Mandetta
ocorreu a coletiva do presidente e seus ministros para dar satisfação à
sociedade e apresentar as iniciativas a serem tomadas.
O governo fala em “operação de guerra”, mas batalhas
importantes já foram perdidas, começando pela da comunicação, sendo que o
presidente muito atrapalhou nessa frente.
Não houve qualquer coordenação interna do governo. Ministros
das várias áreas envolvidas se omitiram e o governo ficou paralisado. O presidente,
ao alimentar conflitos e fazer da epidemia uma bandeira política, impediu a
coordenação de esforços com entes da federação e os demais poderes.
Na coletiva de ontem, faltou resposta à altura ao grave
quadro e nada muito concreto foi anunciado sequer para conter o contágio de
pessoas e preparar a rede hospitalar. Segundo o ministro da Saúde, a
estabilização de novos casos da doença poderá ocorrer apenas em julho; isso em
um cenário benigno.
De batalha em batalha perdida, o País caminha rapidamente
para o isolamento social, sofrimento da sociedade e quadro recessivo, sem
contar os riscos de desabastecimento. O que não se sabe é em qual intensidade.
Políticas macroeconômicas tradicionais para lidar com a
crise são praticamente inócuas. Nem mesmo as localizadas, como as intervenções
do Banco Central no mercado de câmbio.
Se em condições menos agudas as intervenções têm eficácia
bastante limitada, agora, ainda mais, pois todos os vetores puxam o dólar para
cima. As incertezas no mercado global se somam aos riscos internos derivados da
escalada da epidemia no Brasil. Essa política, na melhor das hipóteses, pode
ajudar a dirimir problemas de liquidez no mercado cambial. Mesmo a contenção de
movimentos de manada, quando o mercado fica sem referências, ficou bastante
dificultada.
Do lado da política monetária, não será o corte da Selic
para 3,75% que mudará o cenário econômico. As respostas dos bancos centrais no
mundo que reduzem as taxas de juros parecem uma tentativa de acalmar os
mercados do que fruto de uma visão mais estruturada de médio prazo. O crédito
na economia não irá reagir aos juros ainda mais baixos.
Por essa mesma razão, ainda que o mercado venha a reagir
positivamente à medida – o que não está claro já que a decisão do Copom veio
dentro do esperado e com sinalização de pausa adiante –, será algo de
curtíssimo prazo. Nada que acalme os mercados efetivamente e limite o contágio
financeiro na economia.
Talvez o mais adequado teria sido aguardar para cortar os
juros, guardando munição para o futuro, quando as políticas de estímulo à
demanda poderão ser mais eficazes. E o futuro que nos aguarda poderá ser muito
difícil a depender da capacidade de ação do governo.
Trazer algum alento aos mercados, contendo perdas e o aperto
das condições financeiras, dependerá de ação conjunta do governo. Não se pode
esperar tanto do Banco Central.
A sociedade pede ação, o setor produtivo pressiona por ajuda
e o mercado financeiro por medidas econômicas que estanquem as perdas.
Nessa guerra será necessário estratégia para definir as
batalhas de cada dia e coordenação de esforços. Atirar às cegas, não.
*Consultora e doutora em economia pela USP
Nenhum comentário:
Postar um comentário