O avanço do coronavírus parece ter convencido o presidente Jair
Bolsonaro da importância de vestir máscara e lavar as mãos para evitar o
contágio, mas não das virtudes da prudência e da moderação.
Dois dias depois de classificar o vírus como uma fantasia
inventada pela imprensa, tratando com leviandade os riscos criados pela
pandemia, o presidente rendeu-se aos fatos diante da confirmação de que seu
próprio secretário de Comunicação havia sido infectado.
Em dois pronunciamentos na noite de quinta (12), primeiro
dirigindo-se à claque das redes sociais e depois em
cadeia de rádio e TV, Bolsonaro reconheceu a gravidade da situação e disse
que o governo está preparado para controlá-la.
Sem detalhar medidas ou transmitir orientações, ele logo
passou ao assunto que realmente o preocupava e sugeriu o adiamento das
manifestações antes programadas para este domingo (15).
O próprio Bolsonaro vinha insuflando os protestos, que
tinham o Congresso e suas principais lideranças como alvos principais, e voltou
a fazê-lo ao pedir que os apoiadores fiquem em casa para conter a disseminação
do vírus.
A sugestão foi prontamente acatada pelos organizadores dos
atos, mas o presidente fez questão de enaltecê-las como expressões legítimas de
insatisfação popular e disse que a mobilização alcançara resultados antes mesmo
de começar. “Foi dado um tremendo recado para o Parlamento.”
É fácil perceber que Bolsonaro fabricou mais uma crise com o
único objetivo de intimidar o Legislativo, parte de um esforço permanente para
submeter instituições democráticas a desgaste contínuo.
Os últimos acontecimentos deixaram claro que as provocações
do presidente são fonte permanente de instabilidade e desafiam a capacidade do
sistema político de enfrentar os problemas reais que desafiam o país —da crise
do coronavírus à debilidade econômica.
Antes de vestir a máscara para falar aos seguidores,
Bolsonaro passou duas semanas desautorizando os articuladores do Palácio do
Planalto e fustigando os líderes do Congresso, que buscavam solucionar a
disputa travada com o Executivo pelo controle do Orçamento.
Na quarta (11), quando os parlamentares derrubaram de forma
irresponsável o veto do presidente a um dispositivo que aumenta gastos com
benefícios assistenciais, não havia ninguém capaz de ajudá-lo a evitar a
derrota.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, prometeu medidas
emergenciais e cobrou empenho do Legislativo para aprovar as reformas
econômicas. Pode ser o início de um diálogo mais produtivo, mas que não
avançará se Bolsonaro continuar apostando no tumulto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário