Há quatro semanas, Jair Bolsonaro recebeu um esboço de plano
para criação de 1.008.635 empregos nos próximos dois anos. Encomendara o
projeto a assessores, militares na reserva, e aos ex-deputados Rogério Marinho
(PSDB-RN), ministro do Desenvolvimento, e Onyx Lorenzoni (DEM-RS), da
Cidadania.
Bolsonaro entregou o programa ao chefe da Casa Civil, Walter
Braga Netto. Atravessaria os próximos dois anos em campanha pela reeleição,
inaugurando obras com 42 mil novos empregos a cada mês. A pandemia já delineava
um cenário tétrico, com 200 mortes, mas ele se mantinha no modo ignorância
desdenhosa: “Outros vírus já mataram muito mais”. Já decidira demitir Luiz
Mandetta (Saúde) e Sergio Moro (Justiça).
Marinho e Onyx estavam ajudando-o a abrir as portas do
governo a lideranças políticas notórias pelo clientelismo. Se reuniram com
Paulo Guedes, da Economia. Sobraram divergências e ressentimentos, com excesso
de acidez entre Guedes e Marinho. A “agenda única” escanteava Guedes, e
invertia sua proposta liberal, impondo protagonismo ao Estado na saída da
crise. Era uma rasteira no “Posto Ipiranga”, dada pelo presidente, sob o bastão
de comando ao chefe da Casa Civil.
Guedes dissimulou em público com a passividade de monge
budista. Assistiu, quieto, ao presidente comandar uma sessão de slides sobre 65
obras rodoviárias, 42 aquaviárias, 32 aeroportuárias e sete ferroviárias. No
silêncio efervesceram conversas sobre sua demissão.
Ontem, Bolsonaro recuou. Guedes agradeceu-lhe a “confiança”
e anunciou que tudo segue como antes. O presidente já colecionava 24 pedidos de
impeachment, dois inquéritos criminais no Supremo e a caminho de um novo, por
improbidade. Em três semanas o número de mortos pelo vírus subiu de 200 para
mais de mais de 4.500 — mais de 2.150% no registro oficial. Ainda não há
indício de que o governo tenha um plano, além do pandemônio político criado em
plena pandemia.
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