Caros brasileiros,
ainda se lembram da Operação Rio? Com essa
"operação", o então governador do Rio de Janeiro, Marcello Alencar,
queria combater a violência nas favelas da cidade maravilhosa. Em outubro de
1994, mandou tanques e tropas do Exército brasileiro aos morros. Depois de sete
meses, desistiu. A "operação" era cara demais e não foi capaz de
diminuir o tráfico e a violência.
Desde então, me pergunto: de onde vêm a confiança e a fé
inabalável de que as Forças Armadas podem colocar ordem na casa? Será que é um
sinal de desespero?
Até hoje, as Forças Armadas se mantêm como a instituição em
que a população brasileira mais confia. Segundo uma pesquisa do instituto
Datafolha de julho de 2019, 42% dos entrevistados disseram confiar muito nos
militares, 38% confiam um pouco, e 19% não confiam.
Desde o fim da ditadura militar, as Forças Armadas foram
chamadas inúmeras vezes para "socorrer" o país: no combate ao crime
organizado, na Copa, nas Olimpíadas, nas UPPs, para expulsar garimpeiros de
reservas indígenas. E, agora, na crise do coronavírus: o prefeito do Rio,
Marcelo Crivella, pediu "ajuda" dos militares a fim de reduzir a
circulação de pessoas nas ruas.
Mas apesar de todos esses gritos de socorro, o crime
organizado continua aterrorizando a população nas comunidades das grandes
metrópoles. A invasão de garimpeiros em reservas indígenas progride, assim como
a grilagem e o desmatamento ilegal na Floresta Amazônica. E, claro, as
infecções por coronavírus não vão parar com o Exército nas ruas.
O balanço
dos militares na história recente do Brasil não é dos melhores. Após
25 anos no poder, eles entregaram o país altamente endividado, com
hiperinflação, educação pública falida e alto desemprego.
As "obras faraônicas" do "Brasil
Grande", entre eles a rodovia
Transamazônica, o projeto de celulose de Jari e as usinas nucleares de
Angra, fizeram a dívida externa do país estourar, e custam caro ao Brasil até
hoje. A "década perdida" foi uma herança pesada para a transição
democrática.
Além da dívida econômica, também a repressão política e a
violação de direitos humanos durante a ditadura deixaram a sociedade marcada, e
as famílias das vítimas, traumatizadas. O trabalho
da Comissão Nacional da Verdade não causou um grande debate nacional,
os crimes contra direitos humanos não foram punidos, e as velhas narrativas
sobre os militares e um suposto passado melhor continuam. O "milagre
brasileiro" se sobrepõe à repressão política, ao inchaço do setor público
e à corrupção.
As experiências mais recentes com operações militares também
não foram muito promissoras. Ficou evidente que tropas e tanques podem até
abafar crises e garantir uma certa ordem, mas não são capazes de solucionar
problemas estruturais. Sem projeto político, visão estratégica e diálogo com a
sociedade, esses problemas são empurrados para a frente e estouram na próxima
ocasião com mais impacto ainda.
Parece que as Forças Armadas entenderam isso melhor do que o
próprio presidente e seus seguidores, que participaram recentemente de protestos
a favor da intervenção militar na frente do Quartel-General do
Exército em Brasília.
Pode ser uma ironia do destino que um capitão reformado
perca o apoio justamente dos militares que ele mesmo chamou para compor seu
gabinete. E em vez de uma intervenção militar, os militares venham a intervir
pela democracia. Nunca imaginei que um dia chegaria a esse tipo de raciocínio.
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