O ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto
Heleno, divulgou ontem uma “nota à Nação brasileira” para dizer que é
“inconcebível e, até certo ponto, inacreditável” o “pedido de apreensão do
celular do presidente da República”. A nota do ministro é, em si mesma, para
usar suas próprias palavras, inconcebível e inacreditável.
O ministro Augusto Heleno fazia referência a solicitações de
parlamentares e partidos de oposição em notícia-crime enviada ao Supremo
Tribunal Federal, relativa a suspeitas de que o presidente Jair Bolsonaro
tentou interferir politicamente na direção da Polícia Federal, conforme denúncia
do ex-ministro da Justiça Sérgio Moro, igualmente citado na petição.
Respeitando a praxe para casos como esse, o ministro do
Supremo Tribunal Federal Celso de Mello encaminhou o caso para a
Procuradoria-Geral da República, a quem cumpre opinar se cabe ou não investigar
a denúncia. O ministro Celso de Mello enfatizou que é dever jurídico do Estado
apurar essas suspeitas, “quaisquer que possam ser as pessoas alegadamente
envolvidas, ainda que se trate de alguém investido de autoridade na hierarquia
da República, independentemente do Poder (Legislativo, Executivo ou Judiciário)
a que tal agente se ache vinculado”.
É sintomático que o decano do Supremo tenha que relembrar
tamanha platitude: numa República em que vigora o Estado Democrático de Direito
ninguém está acima da lei, inclusive o presidente. Infelizmente, como mostrou a
afrontosa nota do ministro Augusto Heleno, a advertência do ministro Celso de
Mello é mais do que oportuna – é indispensável.
Para o ministro Augusto Heleno, “caso se efetivasse (a
apreensão do celular do presidente), seria uma afronta à autoridade máxima
do Poder Executivo e uma interferência inadmissível de outro Poder na
privacidade do presidente da República e na segurança institucional do País”.
Ora, ainda que o pedido de apreensão do celular fosse aceito
pela Procuradoria-Geral, o que ainda não aconteceu nem se sabe se acontecerá,
não haveria nenhuma “afronta à autoridade máxima do Poder Executivo”, apenas o
cumprimento do que mandam os diplomas legais em vigor no País que o sr.
Bolsonaro governa – e que ele, aliás, prometeu solenemente respeitar quando
tomou posse.
Mas o ministro Augusto Heleno não se limitou a expressar sua
indignação e enveredou pelo temerário caminho da ameaça de ruptura
institucional: “O Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da
República alerta as autoridades constituídas que tal atitude é uma evidente
tentativa de comprometer a harmonia entre os Poderes e poderá ter consequências
imprevisíveis para a estabilidade nacional”. Recorde-se, para todos os efeitos,
que o cidadão Augusto Heleno é general reformado, sem comando, e, atualmente,
funcionário público demissível ad nutum.
Assim, o ministro Augusto Heleno elevou à categoria de
comunicação oficial do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da
República os libelos golpistas que circulam nas fétidas redes sociais
bolsonaristas, que passaram o dia de ontem a demandar nada menos que o
fechamento do Supremo Tribunal Federal – sob a hashtag “Heleno já tá na hora”.
Nada disso é por acaso: a nota oficial de teor sedicioso e a campanha de ódio
contra o Supremo se anteciparam à decisão do ministro Celso de Mello de
autorizar a divulgação, na íntegra, da reunião ministerial que, segundo o
ex-ministro Sérgio Moro, comprova a tentativa do presidente Bolsonaro de
interferir na Polícia Federal, entre outras barbaridades deste desgoverno.
Está claro que o ministro Augusto Heleno, assim como seu
chefe, não só é completamente despreparado para o cargo que ocupa, como
considera “democracia” o regime em que Bolsonaro manda e os demais obedecem.
Mais do que isso: colabora decisivamente para que suas atitudes irresponsáveis,
de natureza essencialmente pessoal, pois sua função não é falar em nome do
governo, sejam confundidas com o pensamento das Forças Armadas. Assim, urge que
os comandos militares desvinculem as Forças Armadas desses inconformados com a
democracia que, para desgraça do País, chegaram à Presidência nas eleições de
2018. Se não o fizerem imediatamente, e de maneira clara, correm o risco de ver
sua imagem, duramente reconstruída depois de 20 anos de ditadura, atrelada a um
governo que flerta dia e noite com a ruptura.
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