SÃO PAULO O ex-governador de São Paulo, empresário e
dirigente esportivo Laudo Natel morreu na manhã desta segunda-feira (18), aos
99 anos. A causa da morte não foi divulgada.
O São Paulo Futebol Clube, que foi dirigido por Natel,
comunicou o falecimento nas redes sociais e disse lamentar a partida de seu
patrono.
"Nosso eterno agradecimento a uma das figuras mais
importantes da história de nosso clube pelas décadas de amor incondicional às
nossas cores", afirmou. O clube decretou luto de três dias.
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB),
disse em uma rede social que recebeu com tristeza a notícia. Para ele, o
ex-ocupante do cargo "foi um permanente defensor do estado de São Paulo
nas várias funções que exerceu na vida pública e na iniciativa privada".
"Aos familiares e amigos, nossos sinceros
sentimentos", afirmou o tucano.
Biógrafo do ex-governador, o jornalista Ricardo Viveiros
disse em uma rede social que Natel "foi um pequeno grande homem, simples,
ético, capaz, trabalhador, elegante, sensível e de larga visão como
empreendedor".
Viveiros, que publicou
em 2010 o livro "Laudo Natel: Um Bandeirante", afirmou ainda que
o político, "em duas gestões como governador em tempos sombrios,
transformou o estado de São Paulo, antecipando o futuro".
Laudo Natel (1920-2020) governou São Paulo em duas gestões
na ditadura
militar (1964-1985), mas sua influência política desapareceu com a ascensão
de seu ex-secretário Paulo Maluf —que
o derrotou na convenção da Arena que indicou o candidato do partido a
governador, em 1978.
Sua carreira política começou tarde e foi impulsionada, em
grande parte, por seus êxitos nos negócios. Filho de um administrador de
fazendas, Natel nasceu em São Manuel (SP), em 14 de setembro de 1920.
Quando seu pai morreu, em 1937, ele desistiu de tentar
estudar direito e começou a trabalhar como funcionário do Banco Noroeste, em
Pirajuí (SP). Lá conheceu sua mulher, Maria Zilda —com quem teria dois filhos,
Ivan e Maurício.
No Noroeste ele se tornou amigo de Amador Aguiar, gerente da
agência de Lins (SP), com o qual trabalhou como subcontador. Quando o Bradesco
foi fundado, em 1943, na cidade de Marília (SP), Amador foi convidado para
dirigir o banco, e convenceu Natel a acompanhá-lo.
Mudou-se para São Paulo em 1945, quando a sede do Bradesco
foi transferida para a capital e no ano seguinte tornou-se sócio do São Paulo Futebol Clube.
Natel estudou economia na USP e, em 1950, tornou-se um dos
diretores do Bradesco. Dois anos depois, assumiu também o Departamento de
Finanças do São Paulo.
Convenceu a diretoria do clube a vender seu terreno no
Canindé para quitar suas dívidas e iniciar a construção do estádio
do Morumbi, com projeto do arquiteto Vilanova Artigas.
Segundo Natel, o Morumbi (que custou cerca de US$ 70
milhões) foi integralmente pago por meio de campanhas, sorteios, venda de
cadeiras cativas e de títulos patrimoniais. Mas o clube também recebeu recursos
da Prefeitura de São Paulo (em 1956) e do governo estadual (de 1956 a 1958),
que somaram US$ 3 milhões.
Em 1958, Natel foi eleito presidente do clube. Passou também
a assumir diversos cargos em organismos empresariais —como diretor da
Associação Comercial de São Paulo e do Sindicato dos Bancos de São Paulo.
Em 1961 foi convidado para ser candidato a vice-governador,
no ano seguinte. Na época as eleições para governador e vice eram separadas. O
governador Carvalho Pinto (PDC) lançou seu ex-secretário José Bonifácio
Coutinho Nogueira. Como candidato a vice, a coligação lançou Natel.
A eleição ao governo se polarizou entre Jânio Quadros (PTN)
e Adhemar de Barros (PSP), que venceu por pequena margem (1.249.414 votos a
1.125.941). Mas, para vice, Natel ganhou com 1.200.807 votos, contra 944.604 de
Faria Lima (vice de Jânio) e 543.411 de Teotônio de Barros (vice de Adhemar).
Após a posse, Natel se aproximou do governador —que apoiou
abertamente a deposição do presidente João Goulart, em 1964. Em 1965, ainda
como vice de Adhemar, Natel concorreu à Prefeitura de São Paulo pelo PR, mas
perdeu para o janista Faria Lima: este teve 452.162 votos, contra 198.222 de
Natel.
Após vários desentendimentos com o governo federal, Adhemar
teve seu mandato cassado em 5 de junho de 1966. O general Castello Branco
permitiu a posse de Natel, com a condição de que este aceitasse os nomes
indicados pelo Planalto para a Secretaria de Fazenda (Delfim Netto) e para o
comando da Força Pública (João Baptista Figueiredo).
Natel concordou e assumiu no dia 6 de junho. Ficou no cargo
até 31 de janeiro de 1967. Nesse período, reuniu as 11 usinas hidrelétricas de
São Paulo na Cesp
(Companhia Energética de São Paulo) e melhorou as finanças estaduais.
Findo seu mandato, Natel se preparou para disputar a próxima
eleição para o cargo, intensificando suas idas ao interior. Mas as eleições
para governador continuaram sendo feitas de forma indireta, e na prática a
decisão cabia ao presidente.
Em 1969, quando ainda presidia o São Paulo, ele convidou o
general Costa e Silva para a inauguração do estádio do Morumbi, em 1970. Com a
doença e morte do presidente, o general Emílio Médici assumiu o cargo.
Laudo Natel decidiu convidá-lo: “Eu fiquei até em dúvida se
devia convidar o Médici, porque já tinha convidado o Costa. Depois eu
raciocinei: não estou convidando propriamente a pessoa, estou convidando o
presidente. Então ele veio”.
Segundo Natel, os assessores de Médici temiam que ele fosse
vaiado: “O Morumbi estava lotado, e eu quis que ele entrasse comigo dentro do
estádio. A segurança dele, o pessoal de assessoria temia que ele pudesse ser
vaiado. Falei: ‘Presidente, pode entrar tranquilamente porque eu não posso ser
vaiado hoje, e o senhor vai entrar comigo’. Ele entrou e, para sua surpresa,
foi uma ovação. Cento e dez mil pessoas de pé, aclamando”.
Na opinião de Natel, esse fato contribuiu para sua
escolha como governador, em 1970: “Não sei se ele se impressionou também um
pouco com isso, o fato é que um dia recebo um telefonema dele e dizia: ‘Olha,
eu tô lhe convidando pra ser governador de São Paulo e não quero que o senhor
agradeça essa indicação porque eu cheguei ao seu nome, eu estou lhe convocando
pra repartir comigo uma responsabilidade’. E assim me tornei governador”.
Na realidade, apesar de contar com a rejeição do governador
Abreu Sodré, Natel tinha o apoio de dois antigos auxiliares, que estavam com
Médici: Delfim, então ministro da Fazenda, e Figueiredo, que chefiava o
Gabinete Militar.
Natel deixou o cargo de diretor-gerente do Bradesco e assumiu
o governo em 15 de março de 1971. Na sua segunda gestão, unificou a malha
ferroviária paulista na Fepasa, criou a Sabesp, a Cetesb e a Unicamp, inaugurou
as primeiras estações do Metrô de São Paulo e investiu na ampliação das
rodovias —setor a cargo de seu então secretário de Transportes, Paulo
Maluf.
Tentou articular a prorrogação do mandato de Médici, mas
fracassou. Com a posse de Ernesto Geisel na Presidência, em 1974, não teve
nenhuma influência na escolha de novo governador —Paulo Egydio Martins.
Em abril de 1978, porém, após a definição do general João
Baptista Figueiredo como novo presidente, o presidente Ernesto Geisel permitiu
que seu sucessor escolhesse o candidato do Planalto ao governo de São Paulo.
Figueiredo indicou Natel. Contrariado, o governador Paulo Egydio não o apoiou.
Confiante na indicação do Planalto, Natel praticamente não
fez campanha: seus assessores logo recolheram um abaixo-assinado com o apoio de
876 convencionais.
Enquanto isso, seu ex-secretário Paulo Maluf fez questão de
visitar todos os delegados da Arena no Estado. Na convenção do partido,
realizada em 4 de junho de 1978, Maluf derrotou Natel por 617 votos a 589.
Natel recorreu à Justiça, alegando que Maluf era inelegível
porque era acionista da Fiação e Tecelagem Lutfala, empresa que estava sob
intervenção. Mas o recurso foi derrotado no Tribunal Superior Eleitoral por 4
votos a 2.
Aliados de Natel acreditavam que Geisel poderia usar o AI-5,
ainda em vigor, para cassar Maluf, mas o presidente nada fez —e Maluf foi
eleito governador, indiretamente, em 1º de setembro de 1978.
Em 1982, Natel ainda tentou ser indicado candidato a
governador de São Paulo pelo PDS, mas foi derrotado na convenção do partido por
Reynaldo de Barros, que tinha o apoio de Maluf.
Depois disso, dedicou-se apenas a suas atividades no setor privado, como diretor da Companhia Sul-América de Seguros.
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