Não há dúvidas. Jair Bolsonaro e Lula da Silva nasceram um
para o outro.
Tanto o presidente da República como o chefão petista se
associam na mais absoluta falta de escrúpulos, em níveis que fariam até
Maquiavel corar. Pois o diplomata florentino que viveu entre os séculos 15 e
16, malgrado tenha descartado a retidão moral absoluta como fator essencial
para o bom governo, formulou uma ideia de ética específica para a política,
segundo a qual, entre outras regras, o governante jamais deve colocar seus
interesses pessoais acima dos interesses do Estado nem agir como se seu poder
fosse ilimitado: “O príncipe que pode fazer o que quiser é um louco”, escreveu
em sua obra mais conhecida, O Príncipe (1532).
Jair Bolsonaro e Lula da Silva unem-se como siameses.
Enxergam o mundo e seu papel nele da mesmíssima perspectiva. Tudo o que fazem
diz respeito exclusivamente a seus projetos de poder, nos quais o Estado e o
povo deixam de ser o fim último da atividade política e passam a ser meros
veículos de suas aspirações totalitárias.
Ambos, Bolsonaro e Lula, só se importam com o sofrimento e a
ansiedade da população na exata medida de seus objetivos eleitorais. O petista,
por exemplo, declarou recentemente que “ainda bem que a natureza criou esse
monstro chamado coronavírus para que as pessoas percebam que apenas o Estado é
capaz de dar a solução, somente o Estado pode resolver isso”.
Tão certo de sua inimputabilidade, Lula da Silva nem se
preocupou em ao menos aparentar retidão moral, como recomendava Maquiavel aos
príncipes de seu tempo, entregando-se à mais vil exploração política do
sofrimento causado pela pandemia de covid-19. Lula da Silva é, assim, o
anti-Maquiavel: enquanto o florentino elogiou seus conterrâneos por preferirem
salvar sua cidade em vez de salvar suas almas, Lula saúda a morte de seus
compatriotas como uma espécie de sacrifício religioso em oferenda à
estatolatria lulopetista.
Já Bolsonaro, bem a seu estilo, continua a menosprezar os
milhares de brasileiros mortos na pandemia, agora com requintes de crueldade.
Depois do infame “e daí?”, expressão que usou ao reagir à informação sobre a
escalada do número de mortos no Brasil, o presidente da República não viu
nenhum problema em fazer piada com a desgraça do país que ele foi eleito para
governar. “Quem é de direita toma cloroquina, quem é de esquerda toma Tubaína”,
brincou Bolsonaro.
Nem se deve perder tempo procurando graça onde,
definitivamente, não há. Diante das dramáticas circunstâncias, só riu da blague
bolsonarista quem não nutre nenhuma empatia ou respeito pelo sofrimento dos
outros. Para o presidente da República, só os direitistas são dignos de
salvação – por meio da cloroquina, que Bolsonaro, baseado em estudos fajutos,
quer que os brasileiros tomem para que o País supere rapidamente a pandemia e
“volte ao normal”. Já os “esquerdistas” – isto é, todos os que não são
bolsonaristas –, que bebam refrigerante.
Bolsonaro e Lula são o resultado mais vistoso da degradação
violenta da atividade política, aquela que, na concepção de Maquiavel, deveria
almejar a todo custo o bem coletivo. Cada um à sua maneira, um mais truculento,
o outro mais dissimulado, o presidente e o petista se consideram fora do
alcance das considerações éticas que deveriam moderar o poder e que estão no
coração das sociedades democráticas.
Lula trabalha desde sempre para cindir o País – e sua
recente celebração do coronavírus pode ser vista como uma espécie de corolário
macabro da concepção doentia segundo a qual os brasileiros recalcitrantes, que
ainda não aceitam o projeto de Estado autoritário idealizado pelo lulopetismo,
devem ser castigados pela natureza para que aprendam de uma vez por todas que
Lula sempre tem razão. Bolsonaro faz exatamente o mesmo, e ainda enxovalha
publicamente quem se recusa a aceitá-lo como salvador.
O bolsonarismo é um monstrengo antidemocrático que só ganhou
vida e ribalta por obra e graça do lulopetismo. A uni-los, a sede de poder
absoluto. Mas, como já ensinou Maquiavel, não há poder que dure para sempre.
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