Jair Bolsonaro já escolheu as armas para lidar com o
inquérito que pode encurtar seu mandato. Com uma mão, o presidente estala um
chicote contra o Supremo Tribunal Federal. Com a outra, exibe uma cenoura para
o procurador Augusto Aras.
No domingo, o capitão apontou o açoite na direção do
ministro Celso de Mello. Pelas redes sociais, ele insinuou que o decano do
Supremo teria cometido uma ilegalidade ao tornar público o vídeo da reunião
ministerial de 22 de abril.
Para atiçar seus seguidores, Bolsonaro reproduziu artigo da
Lei de Abuso de Autoridade. O texto estabelece pena a quem “divulgar gravação
ou trecho de gravação sem relação com a prova que se pretenda produzir, expondo
a intimidade ou a vida privada ou ferindo a honra ou a imagem do investigado”.
Não foi o caso. A filmagem liberada pelo ministro mostra
agentes públicos em um local público, o Palácio do Planalto. Eles estavam ali
para tratar de assuntos de interesse público, apesar do tom de conversa de
botequim. Se alguém saiu com a honra ferida, é porque não se comportou à altura
do cargo.
O presidente sabe que Celso de Mello se limitou a aplicar a
lei. Seu objetivo é intimidar a Corte e expor o ministro à mira das milícias
virtuais, que já alvejaram alguns de seus colegas.
Antes da liberação do vídeo, Aras tentou censurar quase todo
o seu conteúdo. O decano precisou lembrá-lo de que o Ministério Público não
pode ocultar provas com base em alegações “inadmissíveis”. Foi uma forma
elegante de avisar que procurador-geral da República não é advogado do
presidente.
No Brasil de 2020, as duas funções parecem ser uma só. Ao
balançar a cenoura de uma eventual nomeação ao Supremo, Bolsonaro transformou
seu investigador num aliado de primeira hora.
Ontem os dois protagonizaram uma cena constrangedora. Ao fim
de uma videoconferência, o capitão se convidou a visitar Aras e seu “colegiado
maravilhoso”. O procurador não disfarçou o entusiasmo: prometeu recebê-lo com
“a alegria de sempre”.
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