No dia ainda incerto, mas infalível, em que Jair Bolsonaro
se sentar no banco dos réus, veremos se usará a tática a que se habituou no
poder para se impor numa discussão —silenciar seus interlocutores cortando-lhes
a palavra e repetindo aos gritos seus bordões, como “Chance zero!”, “Ponto
final!”, “Caso encerrado!”, “Próxima pergunta!”, “O recado está dado!”, “Cala a
boca!” e “E daí?”.
A Justiça não se contentará com uma argumentação tão lacônica.
Bolsonaro terá de responder extensivamente sobre os episódios em que violou a
Constituição, estuprou as instituições, acusou sem provas, jogou o povo contra
o Congresso e o STF, botou órgãos de Estado a seu serviço, encobriu sujeiras
dos filhos e dos asseclas, mentiu compulsivamente, agrediu minorias e promoveu
o desmoronamento da nação com seu ministério de celerados. O crime de mandar os
humildes para a morte, exortando-os a sair de casa em plena pandemia, talvez
tenha de ser julgado por um tribunal com sede na Holanda.
Será fascinante seguir Bolsonaro pela TV, defendendo-se no
julgamento com seu vocabulário indigente, português estropiado, expressões
chulas, sotaque caipira, estoque de palavrões e abuso de taoquêis. E mais ainda
porque, apesar de velho político, ele nunca fora contestado para valer —como
deputado de quinta, ninguém perdia tempo com ele e, presidente, achava-se
poderoso demais para discutir.
Condenado em várias instâncias, mas à espera de que se
esgotem os recursos, Bolsonaro, como ex-presidente, deverá ter direito a uma
sala de Estado Maior num quartel da Polícia Federal.
Talvez, então, ele já terá sido abandonado por seus
seguidores. Aqueles que, nos áureos tempos, exerciam em seus ataques aos
opositores um laconismo igual ao do chefe: “Lixo!”, “Chega de mimimi!”,
“Simples assim!”, “Entendeu ou quer que desenhe?” e “Aceitem que dói menos!”.
*Ruy Castro, jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues.
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