Os camisas pardas do bolsonarismo vestem verde e amarelo. As
cenas de selvageria protagonizadas por esses delinquentes travestidos de patriotas
durante manifestação com o presidente Jair Bolsonaro em Brasília, ao agredir o
repórter fotográfico do Estado Dida Sampaio e outros profissionais de
imprensa, envergonham a Nação.
O Brasil civilizado demanda que as autoridades façam uma
investigação independente, rigorosa e célere dos fatos, sem se deixarem
constranger pela truculência e pelo despudor característicos dos bolsonaristas.
O presidente Bolsonaro deveria ser o primeiro a exigir ampla apuração. Mas
Bolsonaro quer fazer o País acreditar que ele nem sabe se houve alguma
agressão, fartamente registrada: “Eu não vi nada. Recriminamos qualquer
agressão que porventura tenha havido. Se houve agressão, é alguém que está
infiltrado, algum maluco, deve ser punido”.
Mais uma vez, o sr. Jair Bolsonaro trata os brasileiros como
tolos. Tenta minimizar os múltiplos crimes e transgressões cometidos em comício
que ele próprio estimulou – a começar pela aglomeração em plena pandemia de
covid-19, passando pelas palavras de ordem golpistas e culminando com a covarde
agressão a jornalistas.
A esta altura, não é mais possível dissociar a violência
bolsonarista daqueles que a inspiram. Mas só há um responsável direto pela
espiral de afronta à democracia por parte dos desordeiros com camisas da
seleção brasileira – este é o sr. Jair Bolsonaro, de quem se esperam desculpas
não em privado, transmitidas por assessores, mas sim públicas, tal como foram
as agressões, e essas desculpas devem ser dadas aos jornalistas atacados, a
este jornal e ao País. Mas já não há mais esperança de que o presidente venha a
desencorajar os boçais que agem em seu nome. Ao contrário: a julgar pelo que
disse no domingo, Bolsonaro está disposto a dobrar a aposta contra a
democracia, envolvendo agora as Forças Armadas – que, segundo ele, “estão ao
nosso lado”.
Depois de sucessivas derrotas no Supremo Tribunal Federal
(STF), Bolsonaro declarou que “chegamos no limite”, que “não tem mais conversa”
e que “faremos cumprir a Constituição, ela será cumprida a qualquer preço” –
referindo-se não à Constituição promulgada em 1988, mas a uma imaginária, que
lhe dá poder absoluto.
O presidente, cujo apoio militar se resume a oficiais que
ele levou para o governo e que são seus amigos dos tempos de quartel – relação
que produz um tipo de lealdade que é pessoal, e não em torno de princípios –,
claramente tenta enredar as Forças Armadas em sua ofensiva para desmoralizar o
sistema constitucional de freios e contrapesos. “Esse é um fato que traz algum
grau de preocupação, porque as Forças Armadas são instituições de Estado,
subordinadas à Constituição, e portanto não estão vinculadas a governo nenhum”,
reagiu o ministro do STF Luís Roberto Barroso, revelando uma inquietação que
deveria ser de todos. Cabe aos chefes militares deixarem claro que nada têm a
ver com a aventura bolsonarista e que, ao contrário, a repudiam.
Também se espera das forças vivas da Nação que manifestem
não apenas sua repulsa, mas principalmente seu destemor diante de Bolsonaro e
do bolsonarismo. “Cabe às instituições democráticas impor a ordem legal a esse
grupo que confunde fazer política com tocar o terror”, disse o presidente da
Câmara, Rodrigo Maia. É preciso demonstrar que a Bandeira Nacional não pertence
a essa minoria de desqualificados, que tentam sequestrar os símbolos pátrios
para se apresentarem como os únicos brasileiros do País – os demais seriam
“comunistas”, como foi chamado o ministro do STF Alexandre de Moraes, autor de
decisões contrárias a Bolsonaro, numa intimidatória manifestação bolsonarista.
A escalada golpista coincide com o avanço de investigações sobre o clã Bolsonaro. E também coincide com a redução significativa do apoio popular ao presidente: a mais recente pesquisa da XP/Ipespe mostrou que em uma semana cresceu sete pontos porcentuais, para 49%, a fatia de brasileiros que consideram o governo Bolsonaro “ruim” ou “péssimo”. O recado a Bolsonaro vai ficando assim claríssimo: cada vez menos brasileiros toleram um presidente que, eleito para governar para todos, escolheu agir como condutor de pandilha.
Nenhum comentário:
Postar um comentário