Pela segunda vez em poucos dias, o ministro da Defesa,
General Fernando Azevedo e Silva é obrigado pelas circunstâncias políticas
provocadas pelo presidente Jair Bolsonaro a soltar uma nota oficial tentando
retirar as Forças Armadas do protagonismo em que o presidente as coloca em
manifestações antidemocráticas.
A frase dúbia dita por Bolsonaro durante manifestação de
domingo sobre as Forças Armadas tem o propósito de colocá-las ao lado das
atitudes ilegais e inconstitucionais que está cometendo.
As Forças Armadas teriam que se pronunciar, natural que não
pudessem dizer claramente que o presidente está mentindo, ou usando-os como
biombo para ações ilegais, mas coube uma nota oficial a respeito do
entendimento sobre democracia, respeito às leis, ao Congresso e ao STF, para
que não paire no ar nenhuma dúvida de que não estariam realmente ao lado de
Bolsonaro quando ele quebra as regras da democracia.
Sublinhando que as Forças Armadas são “organismos de
Estado”, já eximiram-se de uma atuação de Governo, como a de domingo em frente
ao Palácio do Planalto, com um teor político explosivo. Bolsonaro, no entanto,
ainda tem uma compreensão por parte de seus pares militares, que não entenderam
ainda, ou não querem entender, que essas manifestações são claramente ilegais.
Ao dizer na nota oficial que a “liberdade de expressão é
requisito fundamental de um país democrático”, os chefes militares trataram
como normal manifestações que pregam ações ilegais por parte das Forças
Armadas, o que não tem nada de normal.
Bolsonaro está diariamente transgredindo a lei, cometendo
crimes de responsabilidade e crimes comuns, e vai chegar o momento em que
retóricas dele e a dos que o combatem não serão mais suficientes. Nem notas
oficiais do ministério da Defesa.
Bolsonaro está esticando a corda a tal ponto que parece
querer o confronto para constranger o Supremo e o Congresso. É assim que
acontecem os golpes modernos, que não necessitam que as Forças Armadas coloquem
seus tanques nas ruas, apenas que sejam lenientes aos avanços antidemocráticos
do chefe de governo da ocasião.
Ele cria situações constrangedoras, como a nomeação de um
subordinado do delegado de Alexandre Ramagem para a Polícia Federal, numa
tentativa de ludibriar o STF. É uma prova de que quer ter acesso a informações
da Polícia Federal, o que confirma as acusações do ex-ministro Sergio Moro.
Ao acusar o Supremo e o Congresso de armarem um complô
contra ele, Bolsonaro, além de instigar seus seguidores contra esses poderes da
República, tenta rotular qualquer medida que o contrarie como parte desse
complô imaginário.
Ontem, o ministro do Supremo Gilmar Mendes deu uma
declaração esclarecedora, que tenta evitar que essa ação conspiratória
atribuída ao STF não se torne verdade. Disse que as medidas liminares dos
ministros Alexandre Moraes, impedindo a nomeação do diretor-geral da PF por
desvio de finalidade, e Luis Roberto Barroso impedindo que os diplomatas
venezuelanos sejam expulsos do país neste momento, por razões humanitárias, que
irritaram especialmente Bolsonaro, são decisões pontuais que não podem ser
entendidas como parte de uma ação conjunta contra o Executivo.
Também a proposta do ministro Marco Aurélio Mello de que
atos do Poder Legislativo ou Executivo sejam tratados diretamente pelo plenário
do Supremo, para evitar insinuações de que decisões monocráticas dos ministros
tenham intenções políticas é “uma tentativa de resgatar a atuação do
colegiado”, na definição de Marco Aurelio Mello, mas pode não ser factível,
pois no mais das vezes as decisões liminares são tomadas devido à urgência do
pedido, e não haveria tempo hábil para reunir o plenário.
O ministro Alexandre de Moraes, por exemplo, recebeu o
pedido para sustar a posse de Ramagem na PF na véspera à noite, e teve que
tomar a decisão na manhã da solenidade.
O Supremo Tribunal Federal (STF) é a única instituição que
tem capacidade de anular atos do Legislativo e do Executivo, pela Constituição.
Portanto, falar em independência e separação harmônica de poderes não pode
significar retirar a função específica do Supremo que, como disse Rui Barbosa,
“tem o poder de errar por último”.
O ex-presidente do STF Ayres Britto tem uma definição clara
para essa situação: “Por que o Tribunal tem o nome de Supremo? Porque está
acima de tudo, acima de todos, por ser o mais alto e extremo guardião da
Constituição”
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