Um desdobramento da operação Lava Jato, em São Paulo,
prendeu quatro empresários suspeitos de fazer doações ilegais de campanha para
José Serra, do PSDB, em 2014. Os policiais federais também fizeram buscas em
endereços ligados ao senador, mas não conseguiram entrar no gabinete dele, em
Brasília.
Foi a segunda vez, em menos de 20 dias, que a Polícia
Federal fez buscas em endereços de José Serra. No começo de julho, a Lava Jato
em São Paulo já tinha estado na casa do senador, em uma investigação que apura
doações ilegais da Odebrecht entre 2006 e 2007, quando Serra deixou a
prefeitura de São Paulo para concorrer ao governo do estado. E depois, entre
2009 e 2010, já como governador.
A operação desta terça, batizada de Paralelo 23, apura se
houve irregularidades na campanha de José Serra ao Senado, em 2014. Este
inquérito surgiu da colaboração premiada de Joesley Batista, do grupo J&F.
Uma planilha que o empresário entregou aos investigadores na época fazia
referência a repasse de valores para José Serra.
Essa investigação deu uma guinada em 2019, depois que a
Polícia Federal fechou um acordo sigiloso de colaboração premiada. O delator
contou que, em 2014, foi procurado por José Seripieri Júnior, fundador e
acionista da Qualicorp, uma das maiores operadoras de planos de saúde do país,
e que Seripieri pediu ajuda para transferir R$ 5 milhões para a campanha de
José Serra ao Senado, por meio de caixa 2.
"Este empresário, então, contratou essa estrutura,
montou essa estrutura financeira e societária, visando repassar valores para
vários candidatos sem que isso fosse identificado pela Justiça Eleitoral.
Então, toda essa estrutura visava justamente ocultar o valores da Justiça
Eleitoral, o recebimento desses valores. A maior parte dos crimes se
concentraram aqui em São Paulo - as empresas todas foram montadas aqui, as
tratativas foram aqui", revelou o delegado da PF Milton Fornazari Jr.
O repasse do dinheiro, segundo a investigação, foi feito em
três etapas: R$ 1 milhão chegou à campanha de José Serra por meio de contratos
simulados com a empresa de participação de negócios OV3G; outra parcela, também
de R$ 1 milhão, usou notas fiscais frias da Ultra Print Impressora Ltda. Ainda
de acordo com a Polícia Federal, os outros R$ 3 milhões vieram da LRC Eventos,
que comercializa camarotes da Fórmula 1.
A Justiça Eleitoral paulista decretou a prisão temporária de
quatro empresários: Arthur Azevedo Filho, Rosa Maria Garcia, Mino Mattos
Mazzamati e Seripieri Júnior, fundador da Qualicorp.
"Nós temos no topo da cadeia criminosa, no polo
financeiro, nós temos supostamente ali o acionista controlador da empresa. E no
topo da cadeia, no polo político, nós temos o então candidato, né?",
explicou o delegado.
O juiz Marco Antonio Martin Vargas determinou ainda o
bloqueio de contas bancárias dos investigados e autorizou buscas em 15
endereços na capital paulista, no interior do estado e também em endereços de
José Serra, em Brasília.
A pedido do presidente do Senado, Toffoli suspende buscas
no gabinete de Serra
Os agentes da Polícia Federal chegaram cedo ao Senado, mas
não passaram da porta do gabinete do senador José Serra. Foram barrados por
ordem do presidente da Casa, o senador Davi Alcolumbre, do DEM, que pediu que a
Advocacia do Senado entrasse com uma ação no Supremo contra a operação.
Na visão do Senado, a decisão do juiz de 1ª instância não
teria validade, porque compete ao Supremo Tribunal Federal determinar medidas
cautelares que importem restrição ao exercício do mandato, seja em relação à
prisão ou afastamento do cargo, seja em relação ao cumprimento de medidas de
busca e apreensão nos gabinetes parlamentares.
No documento, a Advocacia do Senado cita julgamento de 2017
do STF, que definiu que algumas medidas cautelares serão determinadas pelo
próprio Supremo, com a palavra final do Legislativo.
O Senado também citou que o prédio onde funciona o Poder
Legislativo seria imune a ações policiais sem autorização expressa do STF e que
os policiais não poderiam levar documentos com informações sigilosas relativas
ao mandato.
Mas, na decisão que autorizou a operação, o juiz Marco
Antonio Martin Vargas tinha afirmado que, em se tratando de investigação em que
o Supremo Tribunal Federal determinou que fosse realizada em primeiro grau, não
há necessidade de autorização da Corte Constitucional para a realização de
busca no gabinete do senador da República ou em seu apartamento funcional.
Perto das 12h, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli,
que está de plantão no recesso do Judiciário, concedeu a liminar, suspendendo
as buscas no gabinete do senador José Serra. Toffoli afirmou que a decisão do
juiz da 1ª Vara Eleitoral desrespeitou a competência do Supremo para determinar
ações de busca e apreensão nas dependências do Poder Legislativo.
O ministro argumentou que "a extrema amplitude da ordem
de busca e apreensão eleva, sobremaneira, o risco potencial que sejam
apreendidos documentos relacionados ao desempenho da atual atividade do
congressista, o que, neste primeiro exame, pode implicar na competência
constitucional da Corte para analisar a medida’’.
Na semana passada, policiais federais estiveram no gabinete
do deputado federal Paulinho da Força, do Solidariedade. Na ocasião, um juiz,
também de 1ª instância e também em uma investigação conduzida pela Justiça
Eleitoral de São Paulo, autorizou a apreensão de documentos no gabinete do
deputado - e essa medida não foi questionada pela Câmara.
À tarde, depois da decisão de Toffoli, o juiz Marco Antonio
Martin Vargas negou pedido de busca e apreensão do celular de José Serra, que
está em um spa em São Paulo. O juiz explicou que, apesar da decisão de Toffoli
versar exclusivamente acerca da suspensão da ordem judicial de busca e
apreensão nas dependências do Senado, mostra-se mais prudente, por ora,
interpretar novos pedidos relacionados ao referido investigado, que,
eventualmente, pode fazer uso do aparelho celular em sua posse para tratativa
de assuntos relacionados ao desempenho de sua atividade parlamentar".
Ao negar o pedido de busca e apreensão, o juiz deu 24 horas
para que a defesa de Serra entregue o celular, caso entenda não haver qualquer
tipo de ingerência ao desempenho de sua atividade como congressista.
O que dizem os citados
A defesa de José Serra declarou estar estupefata com a
operação, afirmou que buscas e apreensões em endereços do senador não se
justificam - e violam a separação dos poderes -, que a atuação dos
investigadores é ilegal, abusiva e acintosa, e que trata de fatos prescritos
para gerar investigações sigilosas, sem que o senador tenha sido ouvido.
A assessoria de José Serra informou que ele está internado
sob supervisão médica e que tem participado de votações do Senado por meio do
sistema remoto da casa.
O PSDB de São Paulo reiterou a confiança no senador Serra,
no Poder Judiciário e no esclarecimento dos fatos.
A defesa de José Seripieri Júnior disse que é injustificável
a decretação de prisão temporária do cliente sobre fatos investigados em 2014,
que os colaboradores não acusam Seripieri de ter feito doações não
contabilizadas - mas relatam que ele fez um pedido de doação em favor de José
Serra - e que coube aos delatores decidir.
A Qualicorp informou que a atual administração da empresa
vai apurar os fatos e que está colaborando com as autoridades.
A Ultra Print Impressora Ltda declarou que nunca fez
campanha ou deu dinheiro para José Serra.
As defesas de Arthur Azevedo Filho e da LRC Eventos não
retornaram o nosso contato.
Nós não conseguimos contato com Rosa Maria Garcia, Mino Mattos Mazzamati e com a OV3G.
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