terça-feira, 21 de julho de 2020

A FESTA DA FARDA

Bernardo Mello Franco, O GLOBO

No “Almanaque do Exército”, ele era o coronel Jonas Madureira da Silva Filho. Na intimidade matrimonial, apenas Madu. O personagem do livro de Marques Rebelo passava os dias de pijama, no conforto da reserva remunerada. Depois do golpe, foi convocado para uma tarefa patriótica: assumir um cargo de chefia no Segal, o Serviço Geral de Abastecimento e Lubrificantes.

“O simples coronel Madureira” se passa no início da ditadura de 1964, quando os militares se apinharam na burocracia federal. Junto com os postos, veio uma penca de diárias, gratificações e mordomias. A mulher de Madu ficou eufórica: sobraria dinheiro para comprar o sonhado faqueiro de prata.

A festa da farda se repete no governo de Jair Bolsonaro. Desde a posse do capitão, o número de militares em cargos civis mais que dobrou. Saltou de 2.765 para 6.157, segundo dados do Tribunal de Contas da União.

Além de estender o cabide, o presidente engordou os contracheques. Em dezembro, o oficialato se esbaldou numa reforma da Previdência bem particular. Enquanto os paisanos sofriam perdas, os fardados ganharam reajustes de até 73%, incluindo novos penduricalhos.

Os oficiais que vão para a reserva passaram a ganhar bônus de oito salários, o dobro da regra anterior. Um dos primeiros a receber o presente foi o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque. Em maio, ele pendurou o quepe de almirante com um mimo de R$ 300 mil.

Ontem o “Estadão” revelou que o governo pretende criar mais duas gratificações exclusivas para os militares. Quem já recebe extras de R$ 1,7 mil passaria a embolsar R$ 6,9 mil. Um fabuloso aumento de 303%.

A farra mostra que o apoio dos quartéis a Bolsonaro virou um negócio lucrativo. A generosidade é tanta que transborda para os herdeiros. A filha do general Villas Bôas, ex-comandante do Exército, já ganhou dois cargos no ministério da pastora Damares. Agora o general Braga Netto, chefe da Casa Civil, deve emplacar a filha na Agência Nacional de Saúde.

Formada em relações públicas, a moça substituirá um servidor de carreira. A vaga fica no Rio, não exige concurso e paga salário de R$ 13 mil. Com uma boquinha dessas, nem o coronel Madureira ousaria sonhar.

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