Quando Bolsonaro disse que não estava com Covid-19, em
março, ninguém acreditou. Agora ele diz que está — e, claro, ninguém acredita
de novo. Parece bobagem, mas só isso já bastaria para torná-lo inapto para o
cargo em qualquer país minimamente funcional: um presidente em cuja palavra
ninguém acredita nunca não tem condições de governar um país.
Aqueles famosos 30% não estão, claro, incluídos nesse
“ninguém”. Eles acreditam. Mas eles também acreditam que o seu líder é boa
pessoa, que a quantidade de milicianos envolvidos no assassinato de Marielle em
torno da famiglia é simples coincidência e que Rodrigo Maia é comunista. Alguns
acreditam até que a Terra é plana.
É muito sintomático que, quando a notícia se espalhou,
nenhum jornal tenha tido confiança suficiente na fonte para afirmar que o
presidente estava infectado. Em vez disso, o que se lia nas manchetes era
“Bolsonaro diz que está com Covid-19”. Imaginem se na Alemanha ou na Nova
Zelândia, governadas por mulheres de palavra, alguém precisaria tomar esse
cuidado.
Quando a imprensa de um país não tem coragem de dar como
verdadeira a declaração de um presidente a respeito da própria saúde, por
qualquer motivo que seja, quem vai mal é o país.
As manchetes só mudaram quando o atestado foi exibido. E,
ainda assim, muita gente — essa colunista y compris — continua não acreditando.
Que valor tem um atestado em nome de Jair Messias Bolsonaro? Por que acreditar
no atestado de um hospital que já aceitou fazer exames com nomes falsos? Em que
circunstâncias foram feitos os exames anteriores? E em que circunstâncias foi
feito o atual? Por que os resultados negativos foram ocultados por tanto tempo,
e o resultado positivo foi exibido assim que saiu, com tanta festa?
Corta para o garoto-propaganda da cloroquina.
Acho que nunca antes na história deste país descemos tão
baixo: um presidente da República fazendo o papel de charlatão oficial,
apregoando uma droga equivocada, dando risada.
— Bem, estou aqui tomando a terceira dose da
hidroxicloroquina. Tou me sentindo muito bem. Tava mais ou menos domingo, mal
segunda-feira, hoje, terça, tou muito melhor do que sábado. Então, com toda a
certeza, tá dando certo. Eu confio na hidroxicloroquina. E você?
Apesar do mal que ele já fez, apesar do mal que ele está
fazendo e do mal que essa declaração ainda vai fazer, torço para que Bolsonaro
se recupere.
Se ele estiver mesmo infectado, coisa na qual não acredito,
como não acreditei antes que não estivesse, quero que tenha uma experiência
Boris Johnson da doença: suficientemente didática para que saia do hospital
convencido de que a Covid-19 não é apenas uma gripezinha, agradecendo aos
médicos e enfermeiros pela sua vida e, sobretudo, tendo respeito pelo
sofrimento e pela vida dos outros.
Torço para que fique bem e que mantenha o “histórico de atleta” para, um dia, responder pelos seus atos diante do Tribunal Internacional de Haia — o destino dos genocidas quando se faz Justiça no mundo.
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