O ministro da Justiça, André Mendonça, diz que pedirá a
abertura de um inquérito para que eu seja investigado por violação ao artigo 26
da velha LSN dos tempos dos militares, que imaginávamos já ter ido para a
reserva.
Não sei bem o que há a investigar. Acreditava que o texto
falasse por si só. Mas vou colaborar, prestando esclarecimentos. O artigo foi
escrito na manhã do dia 7/7, num processador Word. Eu me encontrava sobre o
deck da piscina sem nenhuma companhia que não a de uma incontrolável matilha de
cães. Ah, o computador era um Dell.
É preciso muita criatividade jurídica para ver na minha
coluna original alguma calúnia ou difamação, que é o que possibilitaria o uso
do artigo 26. E o ministro Mendonça, sempre cioso de agradar ao patrão, deveria
ser mais cauteloso. Se conseguir emplacar sua tese de que desejar a morte de
alguém é crime, então seu chefe poderá encrencar-se. Bolsonaro, afinal, torceu
pela morte de Dilma, “infartada ou com câncer”, e defendeu o fuzilamento de
FHC.
Fui bem mais gentil com o presidente do que ele fora com
seus predecessores. Afirmei textualmente que sua vida tem valor e que sua perda
seria lamentável. O ponto é que, no consequencialismo (assim como na República,
se levássemos seus princípios a sério), seu valor não é maior do que o de
qualquer outra vida.
Assim, se estamos convencidos de que as atitudes
negacionistas de Jair Bolsonaro dão causa a um excesso de óbitos na pandemia,
torcer por seu desaparecimento é não só lógico como ético, na perspectiva
consequencialista.
Quando o problema é apresentado de forma abstrata, sem o nome Bolsonaro, como ocorre na literatura dos dilemas morais (“trolleyology”), a maioria das pessoas não pestaneja antes de puxar uma alavanca que sela o destino de uma pessoa para salvar a vida de um número maior de indivíduos. E eu não acionei nenhuma alavanca. Até onde sei, o vírus é indiferente a meus desejos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário