O DEM e o MDB eram a alma dupla do Centrão. Davam
consistência, história, peso político, acesso ao empresariado e à sociedade, ao
paquiderme dominante do espaço parlamentar, agora imbuído de uma nova missão, a
de salvar Jair Bolsonaro. No entanto, estavam em baixa. Ao declararem
independência do governo e se retirarem do bloco, na última segunda-feira, os
dois partidos viraram o jogo e passaram a liderar novamente o processo.
Golpearam, ao mesmo tempo, o projeto do presidente Jair
Bolsonaro de usar o grupo como principal braço da sua articulação política no
Congresso. E derrubaram o arranjo do escolhido para representar o governo nas
negociações, o líder Arthur Lira, que esperava ser premiado com a sucessão à
presidência da Câmara, sem esforço.
Sucessão esta que também ficou incerta porque volta a
colocar na disputa, com presença notável, o candidato que o presidente da
Câmara vier a escolher para suceder-lhe. Não se sabe quem, nem quando será. Por
experiência da sua própria eleição, Rodrigo Maia não tem pressa. Quando recebeu
o apoio do DEM, seu próprio partido, já era véspera da disputa, e, quando o aliado
PSDB se manifestou, já era a manhã do dia D.
Ao se enfraquecer com a saída dos dois principais partidos,
o Centrão enfraquece o governo, que nunca acertou na articulação política. O
presidente demorou a se decidir pela aliança e, quando o fez, depositou suas
esperanças de sustentação em um homem só. A busca de atalhos, na negociação
política, nem sempre dá certo.
Sua estratégia ficou clara: queria ganhar, sim, mas não
bastava. Maia precisava perder. Uma rusga que atravessou o ano e ancorou na
pandemia.
Errou também o presidente por desconhecimento das regras da
articulação, dos princípios e dos ritos na relação entre os Poderes e entre
estes e as unidades da Federação.
Numa conferência recente sobre a intrincada conjuntura
política do País o ex-ministro e ex-presidente da Câmara Aldo Rebelo fez uma
paródia do jargão para cunhar outra expressão que define este tipo de
confluência de desastres em uma mesma situação: “o errado perfeito”. Do manual
do erro, Bolsonaro não deixou nada de fora, cumpriu todos. Tanto que, com um
piparote, a grande aliança que solucionaria seus problemas voou pelos ares.
A primeira lição que o presidente deveria aprender com o
revés é que a articulação política exige ciência, por mais que a palavra atinja
seus brios. Não se coordena a relação do Poder Executivo com o Poder
Legislativo apenas com um general afável, competente relações públicas, e
alguns líderes neófitos e inexperientes membros do baixo clero parlamentar.
Os exemplos de fracassos e sucessos de governos anteriores
ensinam também a quem quer aprender. Não é necessário ao governo ter um Luiz
Carlos Santos que, segundo a lenda, dava nó em fumaça. Muitos depois dele, e
sem a sua experiência e habilidade, saíram-se bem.
Uma segunda lição é que para se ter uma boa articulação
política é preciso ter, primeiro, uma política. Representada em um projeto de
governo a que se possa aderir, em torno do qual estabelecer negociação e
dividir tarefas de execução. Sem isto não dá para fazer nada, a não ser acertos
aleatórios e pontuais, geralmente descumpridos de parte a parte.
O articulador precisa contar com a total confiança do
presidente e inspirar confiança e respeito dos seus interlocutores. Voz de
comando não funciona: articulação política não é uma guerra nem uma campanha
eleitoral. Ah, importante: tem de reconhecer a importância e respeitar a
oposição.
Em um governo forte, com base no Congresso, plano de trabalho, unidade dos ministros, a articulação flui. Mas se é um governo desorientado, como o de Jair Bolsonaro, com um presidente que não tem autoridade além da conferida pelo cargo, assiste-se a uma derrota atrás da outra.
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