A aprovação popular do presidente Jair Bolsonaro melhorou
consideravelmente, segundo pesquisa recente do Datafolha. Passou de 32% em
junho para 37% agora a parcela de brasileiros que consideram Bolsonaro “ótimo”
ou “bom” mesmo com mais de 100 mil compatriotas mortos numa pandemia que
poderia ter sido mitigada se o presidente não tivesse desdenhado da doença nem
das vítimas; mesmo com a economia em ruínas e com perspectivas sombrias graças
à falta de rumo do governo; mesmo com a destruição do Ministério da Educação,
com efeitos avassaladores para o futuro do País; mesmo com a devastação da
Amazônia a olhos vistos, estimulada pela leniência oficial; mesmo com a
transformação do Brasil em pária internacional graças a uma política externa
ideologicamente sustentável; mesmo com o sistemático descumprimento de todas as
promessas de campanha, inclusive aquela que garantia que Bolsonaro não
recorreria ao toma lá dá cá no Congresso; e mesmo com o aparecimento
inexplicável de cheques suspeitos na conta da primeira-dama, algo que, em
outros tempos e com outros personagens, causaria furor nacional.
Que a popularidade do presidente tenha aumentado entre os
mais vulneráveis da população, justamente aqueles que dependem da ajuda do
governo federal para atravessar as terríveis provações causadas pela pandemia,
é compreensível, mas não deixa de ser amargo: trata-se da comprovação de que
uma parcela significativa dos brasileiros se dá por satisfeita e fica feliz com
o governo quando tem o que comer.
Mas Bolsonaro melhorou seu desempenho também em segmentos
sociais de maior renda, e sua rejeição, no geral, recuou de 44% para 34%. No
conjunto, o presidente desfruta da maior popularidade desde que começou a
governar. A relevante alta de seus índices de aprovação coincide com sua mudança
de atitude política: em lugar da histrionice autoritária que vinha
caracterizando seu comportamento, para alegria dos camisas pardas bolsonaristas
e desespero do resto do País, Bolsonaro parou de criar uma crise por dia,
calando-se e aproximando-se de partidos fisiológicos para garantir apoio mínimo
no Congresso.
Ou seja, Bolsonaro tornou-se mais popular não em razão de
algo extraordinário que tenha feito à frente da Presidência, mas como
consequência do que deixou de fazer. Isso mostra que o País vive uma espécie de
torpor moral, em que grande parte de sua opinião pública considera as múltiplas
barbaridades cometidas pelo presidente, jogando inclusive com a vida de seus
concidadãos, não só aceitáveis, como irrelevantes, a ponto de passar a
caracterizar seu governo como “ótimo” ou “bom” – embora seja o pior da história
recente, por qualquer critério que se use.
Essa confusão de valores morais permite que Bolsonaro não se
preocupe nem mesmo com a lei. Pois o presidente, horas depois de prometer que
respeitaria o teto de gastos públicos – inscrito na Constituição –, disse em
uma rede social que “a ideia de furar o teto existe, o pessoal debate, qual o
problema?”. Ou seja, para Bolsonaro o cumprimento da lei é algo passível de
“debate”, estabelecendo, portanto, o vale-tudo como parâmetro de administração
e de política.
Quando parte da sociedade perde a capacidade de se
escandalizar com tamanho desdém pelos valores que lhe deveriam ser mais caros –
a vida, a democracia e a lei –, sistematicamente vilipendiados pelo presidente
Bolsonaro, não se augura boa coisa. Mas é preciso insistir: um governante
“ótimo” ou “bom” é aquele que assume a responsabilidade pelos destinos do país,
especialmente em meio a uma grave crise como essa, sem ficar o tempo todo
buscando culpados por seus próprios erros; é aquele que dá um norte claro para
sua administração e procura agregar as melhores experiências, em vez de dividir
a sociedade em “nós” e “eles”; é aquele que sabe que a solução para os
problemas não é fruto de iluminação messiânica, e sim de árdua negociação
política, democrática e institucionalizada; e por fim, mas certamente o mais
importante, é aquele que consegue se colocar no lugar de seus governados.
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