sábado, 5 de setembro de 2020

DIA DA AMAZÔNIA

Do G1, AM
Ao redor do verde da floresta, uma Amazônia foi erguida pelas mãos de missionários, pesquisadores, além de seringueiros e cientistas defensores da preservação e do desenvolvimento sustentável. De Chico Mendes a Irmã Dorothy, historiadores definem esses nomes como "guardiões" e "heróis da terra".
No Dia da Amazônia, celebrado neste sábado (5), o G1 reuniu histórias de algumas personalidades que contribuíram para a formação e preservação da Amazônia brasileira ao longo dos anos.
Para o historiador Abrahim Baze é fundamental fazer um resgate histórico de quem são essas pessoas e o que fizeram em prol da preservação da região.
  • Djalma Batista (1916-1979)
Nasceu em Tarauacá, no Acre, onde viveu até 1929 quando mudou-se para Manaus. Médico e escritor, foi um dos nomes de destaque da ciência na Amazônia. Uma das suas contribuições foi a criação do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em 1952, a mais importante instituição de estudos sobre a região amazônica.
Djalma presidiu a Academia Amazonense de Letras e foi vice-presidente do Conselho Estadual de Cultura. Sua obra está voltada para o desenvolvimento da região. Em sua homenagem, uma das mais movimentadas avenidas de Manaus, capital do Amazonas, é chamada Djalma Batista.
Entre outros trabalhos, escreveu: Letras da Amazônia (1938); Cultura Amazônica (1955); Da Habitalidade da Amazônia (1965); e, O Complexo da Amazônia (1976).
Em suas obras, Djalma é imortalizado por falar abertamente sobre a dificuldade de apresentar a Amazônia ao mundo. O escritor acreditava que a cultura e a biodiversidade da região viviam ocultas, e dedicou sua vida a essa divulgação.
“Djalma Batista foi um dos maiores cientistas da nossa história. Fez pesquisas de alto nível no Amazonas, escreveu sobre a história do Acre. Tudo isso, lutando pela preservação da região. Poucas pessoas trazem para nossos ouvidos a alegria de ouvir nomes como Djalma Batista, nomes que defenderam a Amazônia. Ele é um grande herói, porque mostrou caminhos para preservação da região”, diz Abrahim.
  • Samuel Benchimol (1923-2002)
Samuel Benchimol foi um economista, cientista e professor brasileiro que defendia a sobrevivência do homem com a floresta. Para ele, o homem tinha de ser feliz com a floresta em pé, mas a floresta não poderia se sobressair sobre o bem-estar do homem.
O historiador Abrahim Baze desenvolveu diversos estudos acerca da vida e obra de Samuel Benchimol, voltada à região amazônica. O pesquisador contou ao G1 que Benchimol foi um dos maiores incentivadores do desenvolvimento econômico e sustentável da região.
“A Amazônia ficou órfã a partir da morte de Samuel Benchimol. Não temos um escritor que possa se aproximar da obra dele. Foi o maior amazonólogo de todos os tempos. Ele defendeu a Amazônia como ninguém, escreveu 150 livros. Não passou em branco pela terra”, comentou o professor e historiador Abrahim Baze.
Samuel Benchimol defendia o Distrito Industrial, mas dizia que o polo industrial precisava beneficiar o homem do interior do Estado. Por toda a sua contribuição, a Região Amazônica premia as ideias mais inovadoras voltadas para a ciência, tecnologia e sustentabilidade na Amazônia, no concurso Professor Samuel Benchimol e Banco da Amazônia de Empreendedorismo Consciente.
Ainda conforme contou o historiador, Samuel participou da estruturação da Zona Franca de Manaus, na década de 60. Segundo Abrahim Baze, Benchimol foi para a construção da ZFM um dos intelectuais que mais contribuíram para a economia da Amazônia.
A estruturação da ZFM, da qual Samuel participou ativamente, deu início aos anos dourados para todo o comércio de Manaus, atraindo turistas e empresários de todo o mundo, no intuito de visitar a cidade e comprar produtos industrializados.
Naquela época, segundo contou o historiador, a construção de um polo industrial foi fundamental, pois a produção do látex estava começando a decair na região, que mantinha também a exportação de castanha, óleos vegetais, couros de animais silvestres e de mais produtos menores que eram trazidos do interior do Estado do Amazonas por navios a vapor denominados “gaiolas, chatinhas e vaticanos”.
Como resultado do olhar de Samuel Benchimol sobre a região amazônica, diversos livros voltados para a temática foram escritos por ele, como: Amazônia: a guerra na floresta. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira; Desenvolvimento Sustentável da Amazônia: Cenário, perspectivas e indicadores; Problemas de Desenvolvimento Econômico: com especial referência ao caso amazônico; Pólos de Crescimento e Desenvolvimento Econômico; entre outros.
Ele teve destaque, ainda, ao participar da Rio-92, no Rio de Janeiro, uma conferência mundial de chefes de estado organizada pelas Nações Unidas, que teve como debater os problemas ambientais e apresentar possíveis soluções.
  • Phelippe Daou (1928 - 2016)
Jornalista e empresário, atuou em defesa da questão ambiental na Amazônia e em defesa da Zona Franca de Manaus, como membro do Conselho Deliberativo. Em 1968, junto com Milton Cordeiro e Joaquim Margarido, fundou a Amazonas Publicidade, que deu origem à Amazonas Distribuidora Ltda e Rádio TV do Amazonas S.A., que abrange, entre outras emissoras, a Rede Amazônica de Televisão.
Defensor da região, Phelippe Daou liderou movimentos em defesa da Amazônia, destacando-se entre outros: a implantação da "Universidade do Amazonas"; o "Aeroporto Eduardo Gomes" e as "Rodovias AM 10" (Manaus–Itacoatiara) e "BR 319" (Manaus–Porto Velho).
Parte da vida e obra do jornalista estão eternizadas em memórias e relatos no livro "Phelippe Daou - O Jornalista", de autoria do historiador Abrahim Baze, lançado em 2018. O autor ressalta que o livro mostra a simplicidade com a qual Phelippe convencia as pessoas em relação à importância da Amazônia.
Ainda segundo o historiador, a trajetória de Daou ficou marcada pela defesa do desenvolvimento da Amazônia e da preservação da identidade regional.
"A Amazônia sempre foi de certa forma o grande momento da vida dele. Ele tinha a Amazônia como uma referência muito importante na vida dele e ele estimulava as pessoas em volta dele que eram amigos e parentes a cuidar da Amazônia. Todo e qualquer projeto de preservação, pode ter certeza que o Phelippe estava envolvido", contou.
Foi um dos idealizadores do projeto 'Show das Águas - Meio Ambiente e Cidadania', que levava ações sociais, de saúde e de conscientização a comunidades do interior, além de cursos e palestras educacionais com os mais diversos temas.
Prestou vestibular para a Faculdade de Direito do Amazonas, onde formou-se. Muito cedo ainda, iniciou no jornalismo, como repórter do Jornal do Comércio, mas a ascensão na carreira começaria um ano depois, com sua transferência para a empresa Archer Pinto, proprietária, na época, de "O Jornal e Diário da Tarde", onde exerceu diversas funções redacionais. Atuou ainda como redator da Rádio Rio Mar.
Em 1968, junto com Milton Cordeiro e Joaquim Margarido, fundou a Amazonas Publicidade, embrião deu origem à Amazonas Distribuidora Ltda e Rádio TV do Amazonas S.A., que abrange, entre outras emissoras, a Rede Amazônica de Televisão. Por meio dela, permitiu a comunicação no Norte do país.
Phelippe Daou destacou-se como defensor da Zona Franca de Manaus. Foi membro do Conselho Deliberativo dessa instituição que por consenso representava toda a classe empresarial – a Associação Amazonense de Imprensa e a Associação Comercial do Amazonas.
Phelipe Daou morreu em 2016, aos 87 anos. Um ano após a sua morte, em sua homenagem, foi inaugurada a Ponte Jornalista Phelippe Daou, que atravessa o rio Negro. Ela conecta os municípios de Manaus e Iranduba, e também faz parte da Rodovia Manoel Urbano.
Em 2016, a Câmara Municipal de Manaus (CMM) criou o “Prêmio de Jornalismo Phelippe Daou”, que homenageia profissionais da área da área de comunicação e jornalismo que divulgaram matérias com a temática voltada à Amazônia.
  • Irmã Dorothy ( 1931 - 2005)
Dorothy Stang foi uma religiosa norte-americana naturalizada brasileira que dedicou sua vida em defesa da Amazônia e dos trabalhadores rurais da Região do Xingu, no Pará. Sua atividade pastoral e missionária buscava a geração de emprego e renda com projetos de reflorestamento em áreas degradadas, junto aos trabalhadores rurais da área da rodovia Transamazônica.
Trabalhou, ainda, para reduzir conflitos fundiários na região, que custou, a ela, a própria vida. A missionária foi assassinada em decorrência de conflitos agrários no Pará, em fevereiro de 2005. Ela já vinha sofrendo ameaças, segundo pessoas próximas da religiosa e o Ministério Público Federal. Stang recebeu seis tiros por um pistoleiro e sua morte ganhou repercussão internacional.
Em 1948, aos 17 anos, ela entrou para a congregação das Irmãs de Nossa Senhora de Namur, em Ohio, Estado norte-americano, decidida a ser freira. Depois de 8 anos de estudo, aos 24 anos, Dorothy fez seus votos perpétuos. E foi em prol desses votos que passou a dedicar sua vida às causas em defesa dos mais necessitados.
Na congregação das Irmãs de Nossa Senhora de Namur, os votos perpétuos são: pobreza, obediência e castidade. Entre os anos de 1951 e 1966, a irmã Dorothy Stang foi professora nas escolas da própria congregação das Irmãs de Nossa Senhora de Namur em diferentes lugares dos Estados Unidos.
Por lá, a religiosa ficou até o ano de 1966 quando decidiu que sua missão seria no Brasil, mais especificamente, na Amazônia, onde atuou em defesa dos conflitos sociais. Em suas lutas, a missionária buscava a geração de emprego e renda com projetos de reflorestamento em áreas degradadas, junto aos trabalhadores rurais da Transamazônia.
A religiosa era membro da Comissão Pastoral da Terra (CPT) da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e acompanhou de perto a luta dos trabalhadores do campo. Dorothy Stang dedendia uma reforma agrária justa e consequente, e por isso, mantinha um diálogo com lideres do campo, debatendo ações políticas e religiosas, na busca de soluções para os conflitos relacionados à posse e à exploração da terra na Região Amazônica.
  • Chico Mendes (1944 - 1988)
Chico Mendes foi um seringueiro, sindicalista, ativista político e ambientalista nascido no Acre, que lutou pelos seringueiros da Bacia Amazônica. Para ele, a preservação da floresta e das seringueiras nativas era essencial para o homem e para o desenvolvimento da região. Ele foi assassinado a tiros de escopeta, em 1988.
Toda sua trajetória de luta, segundo contaram os historiadores ao G1 é marcada por um conflito de interesses, entre ambientalistas e grandes fazendeiros, que queriam a floresta derrubada, para que fosse feita a plantação do pasto, fonte de renda dos donos de latifúndios (propriedades rurais da época).
O legado de Chico Mendes pela Amazônia sobrevive por décadas e passa de geração a geração. Criado em 1989, um ano após a morte do ativista, foi criado o Comitê Chico Mendes, que tem a missão de semear o legado do líder seringueiro e manter vigilância para garantir a vidas dos povos da floresta, assim como propor alternativas para um planeta mais sustentável.
Em homenagem ao seringueiro, foi criado, em 1996 pelo Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), o Memorial Chico Mendes, com o objetivo de divulgar para todo o mundo, as ideias e da luta de Chico Mendes , além de apoiar as comunidades agroextrativistas do Brasil.
A filha de Chico Mendes e coordenadora do Comitê, Ângela Mendes, disse, em entrevista ao G1, que o maior legado deixado por ele foi de 'altruísmo e a solidariedade'. Segundo ela, apesar de não ter convivido muito com o pai, o pouco tempo foi o suficiente para conhecer a 'grandiosidade' de Chico.
"Ele recebeu propostas de recompensa financeira para mudar a opinião, posição. Mas manteve-se firme em defesa da justiça social e ambiental. Era um homem à frente de seu tempo. Tinha uma visão macro sobre tudo. Ele conseguiu atravessar fronteiras", contou.
Ela menciona, ainda, uma carta escrita por ele, meses antes de ser assassinado. Na carta, ele se direciona aos jovens do futuro e fala sobre não deixar de lutar pelo que acredita.
“Ele lutou para que houvesse uma aliança entre os povos das florestas o que, naquele tempo, parecia ser algo impensável e difícil de imaginar. E ele escreveu, a partir disso, uma carta aos jovens do futuro, falando sobre revolução. A carta, apesar de ter sido escrita naquela época, ainda nos dias de hoje é muito atual”, concluiu.
Chico Mendes foi seringueiro desde que era criança, acompanhando o pai em incursões pela mata. Por conta desse trabalho, só foi alfabetizado aos 19 anos, já que na maioria dos seringais não havia escolas.
Na época do regime militar na Amazônia, na década de 1970, Chico liderava conflitos de terra. A substituição da borracha pela pecuária intensificou os investimentos fundiários, dificultando o acesso de pequenos produtores às terras, aumentado a devastação ambiental, pela qual Chico lutava contra, além de lutar contra a exploração dos seringueiros.
Heróis Anônimos
Há, ainda, além dos já citados, relatos na história de muitos outros heróis, que às vezes nem são lembrados, segundo o historiador Otoni Mesquita. Ele contou ao G1 que a Amazônia foi construída em meio a muitos conflitos e interesses.
De um lado, segundo ele, estavam os defensores da floresta. E, de outro, os empresários e donos de latifúndio, que visavam o lucro acima da preservação ambiental. De Irmã Dorothy a Chico Mendes, o historiador conta que personagens como esses foram responsáveis por escrever os capítulos do que hoje é chamado de Amazônia.
“Eles discutiram a Amazônia, valorizaram a questão da preservação, do verde, de soberania nacional, da Amazônia cobiçada. São personagens de grande contribuição, e fazer um resgate histórico dessas pessoas é de suma importância para a cultura local e até mundial”, comentou.
Relembrar nomes e momentos marcantes da história é manter viva a memória de um povo e de uma região. O resgate histórico, segundo os historiadores é quem preserva toda essa cultura, e principalmente, apresenta a Amazônia e suas diversas faces para o mundo.
Bookmark and Share

Nenhum comentário:

Postar um comentário