segunda-feira, 7 de setembro de 2020

GOVERNO SEM FOCO

 

Editorial Folha de S.Paulo

Desde setembro de 2019, o Congresso aprovou a nova lei geral de telecomunicações, a reforma da Previdência e a lei do saneamento. Está à beira de passar mudanças na regulação do setor de gás e das falências. Os parlamentares também estão dando mais celeridade à reforma tributária do que Jair Bolsonaro (sem partido).

Para quem desdenha do Parlamento, nota-se que em pouco tempo se fizeram mudanças consideráveis em leis que regulam a vida econômica. Trata-se também de indício forte de que existe propensão reformista no Congresso.

O governo que se diz liberalizante, porém, não tira proveito dessa boa vontade. Ao contrário, não tem clareza de objetivos e retarda o envio de projetos relevantes. Quando o faz, deixa que peguem poeira nos escaninhos legislativos ou cria conflitos contraproducentes.

A reforma tributária é um exemplo gritante da desorganização executiva, da indefinição de prioridades e da incapacidade política.

Apenas depois de passado 40% do tempo de mandato, Jair Bolsonaro enviou um projeto parcial, tímido e mal negociado de alteração do sistema. Seu ministro da Economia ainda insiste em um plano que causa aversão aos parlamentares e, mais espantoso, ao próprio presidente, o da nova CMPF.

Em novembro do ano passado, o governo enviou ao Congresso um grande pacote de reformas fiscais, uma delas até chamada de "emergencial", como a proposta de emenda constitucional que pode sustentar o teto de gastos. Mas deixou tais projetos ao relento e até agora não definiu seu programa fiscal de modo objetivo. Para piorar, aumentou a confusão ao enviar uma reforma administrativa que pode até dificultar a contenção de gastos com servidores, de imediato.

As leis do saneamento e do gás dependem de negociações com estados, pois as estatais estaduais podem criar empecilhos à liberalização. Bolsonaro e Paulo Guedes teriam de liderar outras negociações a fim de implementar as mudanças.

Mas o governo é incapaz de elencar prioridades legislativas ou de evitar embates que não sejam por uma boa causa. Tem ainda dificuldade de lidar com os governadores, quando não os insulta.

Bolsonaro, ele mesmo, não tem convicção reformista; Guedes é atrabiliário e cria conflitos. Sua equipe carece ainda de boa capacidade executiva, evidente na sua lentidão desordenada e na baixa qualidade técnica e legislativa de várias de suas propostas, por isso muita vez rejeitadas pelo Judiciário e pelo Legislativo.

Em suma, são inegáveis os indícios de que o ambiente é favorável às reformas; a liderança parlamentar é reformista. O governo não tem se mostrado à altura.

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