Grandes poderes devem ser exercidos com parcimônia, mas não
foi esse o caso do primeiro ato do ministro Luiz
Fux, novo presidente do Supremo Tribunal Federal, à frente do Conselho
Nacional de Justiça.
Na última terça (15), o ministro decidiu restringir a
aplicação de uma recomendação aprovada pelo CNJ em março deste ano para conter
os efeitos da pandemia do coronavírus no sistema
prisional e proteger os presos mais vulneráveis.
Numa medida de sentido populista, Fux excluiu acusados de
corrupção e outros crimes de colarinho branco dos benefícios da orientação
do CNJ, que recomenda a soltura dos que fizerem parte de grupos de risco e
estiverem presos por crimes não violentos.
Magistrados Brasil afora têm resistido a aplicar a medida, a
começar pelo tribunal que Fux agora preside. Em março, o plenário da corte
deixou claro o caráter facultativo da orientação superior.
Levantamento da Folha mostrou que, entre março e meados de
maio, o STF concedeu somente 6% dos habeas
corpus apresentados por presos que recorreram ao tribunal para fazer
valer a recomendação do CNJ. Fux não concedeu nenhum dos pedidos que chegaram a
seu gabinete nesse período.
Ao sugerir que presos de grupos de risco fossem transferidos
para regime domiciliar, o CNJ buscou evitar a propagação descontrolada do vírus
em presídios superlotados, e não promover a impunidade de corruptos e outros
criminosos, como Fux sugeriu ao justificar seu ato.
Ao enfraquecer a recomendação do colegiado, o ministro agiu
como se minimizasse os riscos da disseminação do coronavírus —que ele mesmo
infelizmente contraiu, como exames confirmaram dias depois de sua posse no
Supremo.
A canetada de Fux tampouco parece justificada por qualquer
urgência que demandasse o uso de suas prerrogativas como presidente do
colegiado, ainda mais diante das evidências de que a Covid-19 se espalha sem
controle nas prisões.
Criado para aprimorar o trabalho dos tribunais e submeter os
juízes a controle externo, o CNJ tornou-se um importante ponto de contato
institucional entre a cúpula do Judiciário e o resto do país.
Advogados e membros do Ministério Público têm assento no
colegiado, e ações como mutirões de audiências de custódia contribuíram para
levar a lei aos cantos mais escuros das prisões brasileiras. A medida tomada
por Fux aponta em direção contrária a esse legado.
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