Via Wikipédia, conheça mais sobre a trajetória desse grande
brasileiro.
Sua prática didática fundamentava-se na crença de que
o educando assimilaria
o objeto de estudo fazendo uso de uma prática dialética com
a realidade, em contraposição à por ele denominada educação bancária, tecnicista e alienante: o educando
criaria sua própria educação, fazendo ele próprio o caminho, e não seguindo um
já previamente construído; libertando-se de chavões alienantes, o educando
seguiria e criaria o rumo do seu aprendizado. Destacou-se por seu trabalho na
área da educação popular, voltada tanto para a
escolarização como para a formação da consciência política.
Autor de Pedagogia do Oprimido, livro que propõe
um método de alfabetização dialético, se diferenciou do
"vanguardismo" dos intelectuais de esquerda tradicionais e sempre
defendeu o diálogo com as pessoas simples, não só como método, mas como um modo
de ser realmente democrático. Trata-se da terceira obra mais citada em
trabalhos acadêmicos da área de humanas em todo o mundo, à frente de clássicos
como Vigiar e Punir de Michel
Foucault e O Capital de Karl Marx.
Foi o brasileiro mais homenageado da história, com pelo
menos 35 títulos de Doutor Honoris Causa de universidades
da Europa e América; e
recebeu diversos galardões como o prêmio da UNESCO de
Educação para a Paz em 1986.[4][5][6] Em
13 de abril de 2012 foi sancionada a Lei nº 12.612, que declara o educador
Paulo Freire Patrono da Educação Brasileira.[7] Segundo
uma pesquisa envolvendo três estados brasileiros, Paulo Freire é o nome de
escola mais comum.
Biografia
Paulo Reglus Neves Freire nasceu em 19 de setembro de 1921
no Recife,
capital do estado brasileiro de Pernambuco.
Filho de Joaquim Temístocles Freire, capitão da Polícia Militar de Pernambuco e
de Edeltrudes Neves Freire, Dona Tudinha, Paulo teve uma irmã, Stela, e dois
irmãos, Armando e Temístocles. A irmã Stela foi professora primária do Estado.
Armando, funcionário da Prefeitura da Cidade do Recife, abandonou os estudos
aos 18 anos, não chegou a concluir o curso ginasial. Temístocles entrou para o
Exército. Aos dois, Paulo agradece emocionado, em uma de suas entrevistas a
Edson Passetti, pois começaram a trabalhar muito jovens, para ajudar na
manutenção da casa e possibilitar que Paulo continuasse estudando.
Sua família fazia parte da classe média, mas Paulo Freire
vivenciou a pobreza e
a fome na
infância durante a depressão de 1929, uma experiência que o levaria a
se preocupar com os mais pobres e o ajudaria a construir seu
revolucionário método de alfabetização. Por seu empenho em
ensinar os mais pobres, Paulo Freire tornou-se uma inspiração para gerações de
professores, especialmente na América Latina e na África. O
talento como escritor o ajudou a conquistar um amplo público de pedagogos,
cientistas sociais, teólogos e militantes políticos, quase sempre ligados a
partidos de esquerda.
A partir de suas primeiras experiências no Rio Grande do Norte, em 1963, quando ensinou
300 adultos a ler e a escrever em 45 dias, Paulo Freire desenvolveu um método
inovador de alfabetização, adotado primeiramente em Pernambuco. Seu projeto
educacional estava vinculado ao nacionalismo desenvolvimentista do
governo João Goulart. Na política, integrou o Partido dos Trabalhadores, tendo sido
Presidente da 1ª Diretoria Executiva da Fundação Wilson Pinheiro, fundação de
apoio partidária instituída pelo PT em 1981 (antecessora da Fundação Perseu Abramo); além de Secretário
de Educação da Prefeitura Municipal de São Paulo na
gestão petista de Luiza Erundina (1989-1992).
Freire entrou para a Universidade do Recife em 1943, para
cursar a Faculdade de
Direito, mas também se dedicou aos estudos de filosofia da linguagem.
Apesar disso, nunca exerceu a profissão, e preferiu trabalhar como professor
numa escola de segundo grau lecionando língua portuguesa. Em 1944, uniu-se em matrimônio
com a colega de trabalho Elza Maia Costa de Oliveira, casamento este que durou
até o ano de 1986, quando sua esposa morreu. Dois anos depois, em 1988, o
educador casou-se com a também pernambucana Ana Maria Araújo, apelidada de
"Nita", que além de conhecida desde a infância era sua orientada no
programa de mestrado da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, onde foi professor. Ambas as esposas foram
reconhecidas por Paulo como importantes em sua carreira, inclusive quando o
educador dedicou seu título de Doutor Honoris Causa na PUC de
São Paulo "à memória de uma e à vida da outra". Em
1946, Freire foi indicado ao cargo de diretor do Departamento de Educação e
Cultura do Serviço Social no Estado de
Pernambuco, onde iniciou o trabalho com analfabetos pobres
Em 1961 tornou-se diretor do Departamento de Extensões
Culturais da Universidade do Recife e, no mesmo ano, realizou junto com
sua equipe as primeiras experiências de alfabetização popular que levariam à
constituição do Método Paulo Freire. Seu grupo foi responsável
pela alfabetização de 300 cortadores de cana em apenas 45 dias. Em resposta aos eficazes
resultados, o governo brasileiro (que, sob o presidente João
Goulart, empenhava-se na realização das reformas
de base) aprovou a multiplicação dessas primeiras experiências num Plano Nacional de
Alfabetização, que previa a formação de educadores em massa e a rápida
implantação de 20 mil núcleos (os "círculos de cultura") pelo País. Em 1964,
meses depois de iniciada a implantação do Plano, o golpe militar extinguiu esse
esforço. Freire foi encarcerado como traidor por 70 dias. Em seguida passou por
um breve exílio na Bolívia e
trabalhou no Chile por
cinco anos para o Movimento de Reforma Agrária da Democracia Cristã e para
a Organização das Nações Unidas para a
Agricultura e a Alimentação. Em 1967, durante o exílio chileno, publicou no
Brasil seu primeiro livro, Educação como
Prática da Liberdade, baseado fundamentalmente na tese Educação
e Atualidade Brasileira, com a qual concorrera, em 1959, à cadeira de
História e Filosofia da Educação na Escola de Belas Artes da Universidade do
Recife.
O livro foi bem recebido, e Freire foi convidado para ser
professor visitante da Universidade Harvard em 1969. No ano anterior,
ele havia concluído a redação de seu mais famoso livro, Pedagogia do Oprimido, que foi publicado
em várias línguas como o espanhol, o inglês (em
1970) e até o hebraico (em 1981). Em razão da rixa política entre
a ditadura militar e o socialismo cristão de Paulo Freire, ele
não foi publicado no Brasil até 1974, quando o general
Geisel assumiu a presidência do país e iniciou o processo de abertura
política. Depois de um ano em Cambridge, Freire mudou-se para Genebra,
na Suíça,
trabalhando como consultor educacional do Conselho Mundial de Igrejas. Durante
esse tempo, atuou como consultor em reforma educacional em colônias portuguesas
na África,
particularmente na Guiné-Bissau e
em Moçambique.
Com a Anistia em 1979 Freire pôde retornar ao Brasil, mas só
o fez em 1980. Filiou-se ao Partido dos Trabalhadores na cidade
de São Paulo, e atuou como supervisor para o programa do partido para alfabetização de adultos de 1980 até 1986. Quando
o PT venceu as eleições municipais paulistanas de 1988, iniciando-se a gestão
de Luiza Erundina (1989-1993), Freire foi nomeado
secretário de Educação da cidade de São Paulo.
Exerceu esse cargo de 1989 a 1991. Dentre as marcas de sua passagem pela
secretaria municipal de Educação está a criação do Movimento de
Alfabetização de Jovens e Adultos (MOVA), um modelo de programa
público de apoio a salas comunitárias de Educação de Jovens e Adultos que
até hoje é adotado por numerosas prefeituras e outras instâncias de governo.
Em 1991 foi fundado em São Paulo o
Instituto Paulo Freire, para estender e elaborar as ideias de Freire. O
instituto mantém até hoje os arquivos do educador, além de realizar numerosas
atividades relacionadas com o legado do pensador e a atuação em temas da
educação brasileira e mundial.
Freire morreu de um ataque cardíaco em 2 de maio de 1997, às 6h53,
no Hospital Albert Einstein, em São Paulo,
devido a complicações em uma operação de desobstrução de artérias. O Estado
Brasileiro, por meio do Ministério da Justiça, no Fórum Mundial de
Educação Profissional de 2009, realizado em Brasília,
fez o pedido de perdão post mortem à viúva e à família do
educador, assumindo o pagamento de "reparação econômica".
Paulo Freire contribuiu com uma filosofia da educação que
veio não só das abordagens mais clássicas decorrentes de Platão, mas
também da fenomenologia-existencial, de pensadores marxistas e anticolonialistas modernos.
De muitas maneiras a sua obra Pedagogia do Oprimido (1970) pode
ser melhor lida como uma extensão, ou de resposta, de Os Condenados da Terra (1961)
de Frantz Fanon, que enfatizava a necessidade de dotar as
populações nativas com uma educação que era ao mesmo tempo nova e moderna (em
vez de tradicional) e anticolonial (e não simplesmente uma extensão da cultura
do colonizador).
Na Pedagogia do Oprimido (1970), Freire
reprisa a distinção entre opressores e oprimidos e diferencia entre as posições
em uma sociedade injusta: o opressor e o oprimido. Freire não faz nenhuma
referência direta a sua influência mais direta para a distinção, que remonta,
pelo menos, na medida em que Hegel em 1802.
Freire defende que a educação deve permitir que os oprimidos
possam recuperar o seu senso de humanidade e, por sua vez, superar a sua
condição. No entanto, ele reconhece que para que isso ocorra, o indivíduo
oprimido deve desempenhar um papel na sua libertação. Como ele afirma:
Da mesma forma, os opressores devem estar dispostos a
repensarem seu modo de vida e a examinarem seu próprio papel na opressão se a
verdadeira libertação deve ocorrer: "aqueles que autenticamente se
comprometem com o povo devem reexaminar-se constantemente" (Freire, 1970,
p. 60).
Freire acredita que a educação é um ato político que não
pode ser divorciado da pedagogia. Ele definiu este como um princípio principal
da pedagogia crítica. Professores e alunos devem estar cientes das
"políticas" que cercam a educação. A forma como os alunos são
ensinados e o que lhes é ensinado serve a uma agenda política. Professores, eles próprios, têm
noções políticas que trazem para a sala de aula (Kincheloe, 2008).
Freire acredita que "a educação faz sentido porque as
mulheres e homens aprendem que através da aprendizagem podem fazerem-se e
refazerem-se, porque mulheres e homens são capazes de assumirem a
responsabilidade sobre si mesmos como seres capazes de conhecerem."
(Freire, 2004, p. 15).
Além de pensadores marxistas, Paulo Freire possui influência
de outras correntes de pensamento, como a fenomenologia-existencial. Segundo
Mendonça (2006), a preocupação primordial de Freire volta-se para a ontologia
do ser humano, que está ligada ao exercício da condição de sujeitos dada
historicamente. Desse modo, surge a práxis humana “como um compromisso
histórico que, ao endereçar os sujeitos ao mundo, possibilita, ao mesmo tempo,
a transformação da realidade e dos próprios seres humanos.” (p. 16).
Filósofos como Martin
Heidegger e Jean
Paul Sartre, Gabriel Marcel e Karl
Jaspers desenvolvem pensamentos existencialistas, cujos princípios se
encontram em Kierkegaard e influenciam efetivamente Paulo
Freire (MENDONÇA, 2006). Ainda na sua obra Pedagogia do
Oprimido, Paulo Freire cita diretamente o Sartre: “Na verdade, não há eu
que se constitua sem um não eu. Por sua vez, não eu constituinte do eu se
constitui na constituição do eu constituído. Desta forma, o mundo constituinte
da consciência se torna mundo da consciência, um percebido objetivo seu, ao
qual se intenciona. Daí, a afirmação de Sartre, anteriormente citada:
‘consciência e mundo se dão ao mesmo tempo’” (Freire, 1987, p. 71).
A fenomenologia de Paulo Freire articula-se com o
existencialismo. “É também sob marcante influência do existencialismo que se
pode compreender a filosofia da educação de Paulo Freire, para quem a educação
é prática da liberdade e a pedagogia, processo de conscientização” (Severino,
2000, p. 303). Embora, faça referência a Sartre, é o existencialismo
cristão de Jaspers e Gabriel Marcel que predomina.
O pensamento existencialista enquanto se ocupa do ser
humano, tem importância para a educação, na medida em que esclarece a condição
dele no mundo. "Paulo Freire (1996) sofre influências desta corrente e a
desenvolve em sua Pedagogia. Se por um lado, uma educação é possível a partir
do pensamento de Sartre (1987), de outro, encontra-se a humanização na
pedagogia de Freire" (MENDONÇA, 2006, p. 161), que
objetiva, finalmente, a humanização das relações no processo de
ensino/aprendizagem.
Modelo bancário de educação
Em termos de pedagogia,
Freire é mais conhecido por seu ataque sobre o que chamou de conceito
"bancário" da educação, em que o aluno é visto como uma conta vazia a
ser preenchida pelo professor. Ele observa que "transformar os alunos em
objetos receptores é uma tentativa de controlar o pensamento e a ação, leva
homens e mulheres a ajustarem-se ao mundo e inibe o seu poder criativo"
(Freire, 1970, p. 77). Esta crítica básica não era nova - a concepção da
criança como um aprendiz ativo de Rousseau já era um passo além da ideia
de tabula
rasa (que é basicamente o mesmo que o "conceito bancário").
Além disso, pensadores como John Dewey também
são fortemente críticos da transmissão de meros fatos como o objetivo da
educação. Dewey muitas vezes descrevia a educação como um mecanismo de mudança
social, explicando que "a educação é um regulamento do processo de vir a
partilhar a consciência social; e que o ajustamento da atividade individual com
base nessa consciência social é o único método seguro de reconstrução
social" (1897, p. 16). O trabalho de Freire, no entanto, atualizou o
conceito e colocou-o em contexto com as teorias e práticas de educação atuais,
que estabelece as bases para o que hoje é chamado pedagogia crítica.
Cultura do silêncio
Segundo Freire, o sistema de relações sociais dominantes
cria uma "cultura do silêncio", que infunde uma autoimagem negativa,
silenciada e suprimida aos oprimidos. O aluno deve desenvolver uma consciência
crítica, a fim de reconhecer que esta cultura do silêncio é criada para
oprimir. A cultura do silêncio também pode fazer com que os
"indivíduos dominados percam o meio pelo qual respondem de forma crítica à
cultura que é forçada sobre eles pela cultura dominante".
A dominação social de raça e classe é entrelaçada no sistema
de ensino convencional, através do qual a "cultura do silêncio"
elimina os "caminhos de pensamento que levam a uma linguagem
crítica".
Impacto internacional
Os principais expoentes de Freire na América do Norte são Henry
Giroux, Peter McLaren, Donaldo Macedo, Joe L. Kincheloe, Carlos Alberto
Torres, Ira Shor e Shirley R. Steinberg. Um
dos textos editados por McLaren, Paulo Freire: A Critical Encounter,
expõe sobre o impacto de Freire no campo da educação crítica. McLaren também
fornece um estudo comparativo entre Paulo Freire e o ícone revolucionário
argentino Che Guevara. O trabalho de Freire influenciou o
movimento chamado "matemática radical" nos Estados
Unidos, que enfatiza questões de justiça
social e pedagogia crítica como componentes de currículos de matemática.
Na África
do Sul, as ideias e métodos de Freire foram fundamentais para o Movimento da
Consciência Negra (em inglês: Black Consciousness Movement),
muitas vezes associado com a figura de Steve Biko,
na década de 1970.[33][34] Há
um projeto sobre Paulo Freire na Universidade de
KwaZulu-Natal em Pietermaritzburg.
Em 1991, o Instituto Paulo Freire foi
criado em São Paulo para ampliar e elaborar as suas teorias da
educação popular. O instituto já tem projetos em muitos países e está sediada
na Escola de Educação e Estudos de Informação da Universidade da Califórnia em
Los Angeles (UCLA), onde arquivos de Freire são mantidos. O diretor é
o Dr. Carlos Torres, professor da UCLA e autor de livros freireanos
incluindo A praxis educativa de Paulo Freire (1978). Desde a
publicação da edição anglófona da obra Pedagogia do Oprimido', Freire
alcançou status quase icônico em programas de formação de
professores dos Estados Unidos.
Em 2016, duas pesquisas demonstram o impacto de sua obra a
nível mundial. A Open Syllabus pesquisou em mais de um milhão de programas de
estudos de universidades dos Estados Unidos, Reino
Unido, Austrália e Nova
Zelândia e descobriu que Pedagogia do Oprimido é o
99º livro mais citado, fazendo do pedagogo o único brasileiro entre os 100 mais
citados e o o segundo melhor colocado no campo da educação, perdendo apenas
para Teaching for Quality Learning in University: What the Student Does,
de John Biggs. Uma pesquisa
da London School of Economics descobriu
que Pedagogia do Oprimido é o terceira livro mais citado
mundialmente na área das Ciências Sociais, segundo dados do Google Acadêmico.
Ataque institucionalizado na Wikipédia
Em 28 de junho de 2016 um texto que acusava Freire e sua pedagogia de inserir doutrinação marxista nas escolas, publicado originalmente por um think tank defensor do neoliberalismo chamado Instituto Liberal, foi inserido em sua biografia na Wikipédia em português. Apesar da edição ter sido revertida após 9 minutos, a viúva de Freire, Ana Maria Araújo Freire, ao tomar conhecimento do fato e saber que a edição foi feita através dos servidores controlados pelo Serpro, o Serviço Federal de Processamento de Dados, protestou em carta pública dirigida ao então Presidente da República em exercício, Michel Temer.
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