A guerra das vacinas entre o presidente Jair Bolsonaro e o governador João Doria é como um copo pela metade: de um lado, gera muita desinformação sobre imunização da população; de outro, promove uma corrida para ver quem vai vacinar primeiro. Entretanto, vamos tratar das vacinas que estão sendo produzidas no Brasil, tanto pelo Instituto Butantan quanto pela Fiocruz, que são as que vão resolver o nosso problema. A Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI) divulgou nota na qual esclareceu que os estudos realizados para testagem de diferentes imunizantes utilizaram critérios distintos.
Por exemplo, no estudo da americana Moderna, foram considerados dois sintomas de um grupo formado por febre, arrepios, dor no corpo, dor de cabeça, dor de garganta, perda de olfato ou paladar com diagnóstico viral confirmado ou um sintoma grave, como falta de ar, tosse, diagnóstico radiológico como casos de covid-19. Ou seja, dois sintomas leves ou um sintoma grave. No estudo da AstraZeneca (Oxford), um sintoma do grupo formado por febre, tosse, falta de ar, perda de olfato ou paladar; ou seja, a maioria sintomas leves, mais um grave (falta de ar), para fechar o diagnóstico.
No estudo do Instituto Butantan, foram considerados casos com qualquer um dos sintomas leves, mais sintomas não incluídos por outros estudos: náusea, vômito e diarreia. Em consequência, esse estudo abriu margem para detecção de mais casos por diagnóstico molecular, que, nos demais estudos, provavelmente, não foram detectados — por não serem considerados sintomáticos. Além disso, focou nos graus de gravidade da doença sugeridos pela Organização Mundial da Saúde (OMS), ao contrário dos demais.
A diferença de parâmetros parece maluquice, mas é um reflexo do avanços da ciência em busca da vacina. Na verdade, as tecnologias também são diferentes e não existe uma padronização para os estudos da fase III, embora a Food and Drug Administration (FDA), dos Estados Unidos, e a nossa SBI recomendem isso. Por exemplo, enquanto a CoronaVac utiliza os métodos tradicionais de produção de vacina, os imunizantes da Oxford e a Sputnik V, por meio de engenharia genética, usaram os adenovírus como “meio de transporte” de genes codificando a proteína S do novo coronavírus (Sars-CoV- 2). Uma vez inoculado, o adenovírus com o gene do coronavírus induz uma resposta imunológica no corpo humano.
Segunda onda
As vacinas BioNTech/Pfizer e Moderna, que já estão sendo aplicadas nos Estados Unidos, também resultam de uma abordagem revolucionária, aplicável a quaisquer vacinas futuras: um vírus é sequenciado, recebe uma parte inofensiva em mRNA, corrigido de modo a não ser imuno-rejeitado, que garante a imunização. Há uma revolução na produção de vacinas. Essa é a notícia boa.
A notícia ruim é o que está acontecendo em Manaus, onde o SUS entrou em colapso por falta de oxigênio, tragédia que pode se reproduzir em outros estados onde a segunda onda já chegou. Não foi à toa que o Reino Unido fechou suas fronteiras para passageiros oriundos do nosso país e de nossos vizinhos. A existência de uma variante brasileira do vírus, confirmada em Manaus, é ainda mais ameaçadora porque os anticorpos de quem já teve a doença, segundo recente pesquisa, garantem imunidade por um período de cinco a seis meses, o que explica o aumento de casos de reinfecção.
O ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, corre para conseguir uma vacina para o presidente Jair Bolsonaro chamar de sua, no caso, a vacina da Oxford produzida na Índia. Ao mesmo tempo, faz suspense sobre a aprovação da CoronaVac. Não estamos, porém, numa guerra civil, como a Revolução Constitucionalista de 1932, estamos numa pandemia. Segundo a SBI, os números totais dos estudos das vacinas da Fiocruz (Oxford) e da vacina do Instituto Butantan (CoronaVac) são muito semelhantes. Entretanto, a vacina da Fiocruz foi testada na população geral, e a do Instituto Butantan, em profissionais de saúde atendendo pacientes da covid-19. O que o estudo do Instituto Butantan diz é que houve redução em 50% de qualquer sintoma na população de profissionais da saúde; e o da Oxford, em 62% de toda a população. Em ambos os casos, o mais importante é que evitam internações e mortes, desde que haja, realmente, vacinação em massa.
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