Quem planta vento colhe tempestade e presidente que trata a covid-19 com sarcasmo paga com impopularidade. Numa profunda e drástica relação de causa e efeito, o Brasil vive uma catástrofe sem precedentes com a pandemia e o presidente Jair Bolsonaro passa por seu pior momento, uma ilha cercada de desastres e más notícias por todos os lados.
O melhor índice do Ministério da Saúde no combate à pandemia, de 76%, foi quando o então ministro Luiz Henrique Mandetta traçava estratégias, tomava providências efetivas e mantinha a população rigorosamente informada. Segundo o Datafolha, esse índice esfarelou para 28% desde Mandetta até o general Eduardo Pazuello.
Assim como não consegue admitir a gravidade da covid-19, Bolsonaro nunca foi capaz de compreender duas obviedades: 1) só combatendo a pandemia é possível reduzir os danos na economia, na renda e nos empregos; 2) o sucesso de Mandetta e da Saúde seria o seu próprio sucesso, seu passaporte para a reeleição.
Por ignorância, teimosia e a mania de dar ouvidos a idiotas, Bolsonaro fez o oposto, demitiu Mandetta e desdenhou a pandemia. O resultado está aí, com recordes de mortos e contaminados, vacinas a conta-gotas, colapso da saúde, descontrole fiscal, quebra-quebra de empresas e… queda de popularidade e de confiança em Bolsonaro: 56% consideram Bolsonaro incapaz de liderar o País.
Pandemia, crescimento baixo, inflação alta (sobretudo para alimentos), aumento dos juros básicos após seis anos dos menores níveis da história e sucessivas altas dos combustíveis têm efeito direito sobre o humor da população – e dos eleitores. E o auxílio emergencial, que demora, é muito menor do que já foi.
No Judiciário, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), que parecia tão amigável, impôs duas derrotas ao “01”, senador Flávio Bolsonaro. Isso nos lembra que oito dos 11 ministros do STF tinham sido nomeados nos mandatos petistas, mas seis deles votaram contra o habeas corpus que livraria o ex-presidente Lula da cadeia. Amigos, amigos, votos à parte. E eles nem são tão amigos assim dos Bolsonaros.
Papai Bolsonaro, assim, está sendo compelido a tomar várias medidas em prol da sobrevivência. A mais vistosa é que ele continua negacionista e falando absurdos como sempre, mas demitiu o general da Saúde e nomeou o quarto ministro em dois anos, Marcelo Queiroga, sem alterar a máxima de que “um manda, o outro obedece”.
Na economia, o presidente continua corporativista, antiliberal e oportunista, fingindo que prestigia o ex-Posto Ipiranga Paulo Guedes, enquanto puxa o tapete dele dia sim, outro também. A última: depois de acertar com Guedes o veto à anulação de dívidas de igrejas com a Receita Federal, ele avalizou a derrubada do próprio veto no Congresso. Jogo duplo. E sujo.
Na política, presidente fraco equivale a Legislativo forte – e a Centrão ganancioso. A aliança fica mais cara quando Bolsonaro cai nas pesquisas e desconvida a médica Ludhmila Hajjar, indicada pelo Centrão, para pôr na Saúde o Queiroga, amigo dos filhos. O presidente da Câmara, Arthur Lira, defensor de Hajjar, agora, bem atrasado, teme que a crise da covid “vire vexame internacional”. E o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, tem uma carta na manga: a CPI da Pandemia.
Bolsonaro está diante de 300 mil mortos de covid, colapso da saúde, desemprego, inflação, dólar alto, gasolina cara, aumento de juros, queda nas pesquisas, agitação no Centrão, risco de CPI e Lula no cangote. Lula é o catalisador das esquerdas. As conversas do centro com a esquerda esquentam. O senador Major Olimpio, morto ontem de covid, fortalece o bolsonarismo arrependido à direita. Nada, porém, tão devastador contra Bolsonaro do que o próprio Bolsonaro.
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