O sistema eleitoral brasileiro implica um emaranhado de interesses, com afiado senso de oportunidade. Política é um jogo de barganhas; à sociedade cabe torcer e zelar para que as negociações coincidam com interesses coletivos. Nesse contexto, o eleitor compõe sua chapa conforme suas preferências, influenciado por pressões locais. Faz as combinações que bem entende. Os agentes se ajustam em torno disso.
Na confluência dos interesses nacionais e locais, as trocas independem de alinhamentos em relação ao governo federal de ocasião. Candidatos a presidente carecem de palanques locais: gente que os espere nos aeroportos, agitando bandeiras, e recursos de toda ordem. Buscam tanto quanto possível as mais fortes lideranças, operacionalmente capazes.
Candidatos regionais são suscetíveis a ondas de opinião pública – Plano Real, em 1994; antipetismo, de 2018. Buscam embalo em candidaturas com maiores perspectivas de decolar, em nível nacional. Em 2018, em razão do antipetismo, Jair Bolsonaro decolou e viveu o ápice de uma carreira apagada. Em São Paulo, João Doria não hesitou em assumir o “Bolsodoria” e Márcio França esconjurou o PT, aliado tradicional do seu PSB. O cálculo é objetivo e oportunista. O “depois” fica para depois.
Há, portanto, um sofisticado jogo de conciliação de interesses. Engenharia política para profissionais conhecedores da peculiaridade de cada Estado e sensíveis ao momento político. Resulta disso a pérola de pragmatismo colhida pela reportagem do Estadão: “de São Paulo para ‘baixo’ o PL vai com Bolsonaro; de São Paulo ‘para cima’, com Lula”. É apenas um exemplo.
Esse ecletismo é facilmente compreendido: dados da pesquisa do Ipec sobre potencial de votos dos candidatos Lula e Bolsonaro (publicada recentemente pelo Estadão) apontam que, no Nordeste, 55% dos consultados afirmam votar em Lula, com certeza; 19% o fariam relação a Bolsonaro. Já no Sul, 32% votariam com certeza em Bolsonaro e 26% em Lula. Ideologias às favas; eleição não tem ponto sem nó.
*Cientista político. Professor do Insper
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