Depois de ter forçado a demissão do presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, por não ter cedido às pressões dos caminhoneiros para que reduzisse o preço do diesel, em março, o presidente Jair Bolsonaro agora está questionando o aumento do preço do gás em 39%. A crítica ao reajuste, decidida nos últimos dias da gestão de Castello Branco com base em critérios técnicos, foi feita na solenidade em que o general Joaquim Silva e Luna deixou o cargo de diretor-geral da Hidrelétrica Binacional Itaipu para assumir a presidência da Petrobrás, em data que ainda não está marcada.
Esses reajustes “foram feitos pensando no Brasil? Não vou interferir, mas podemos mudar esta política de preços lá (sic). Eu falei a ele (o general Silva e Luna), a barra é pesada. Você vai entrar em uma empresa que precisa, cada vez mais, se entender (sic) como a maior estatal do Brasil”, disse Bolsonaro, esquecendo-se de que a Petrobrás é uma sociedade de economia mista e tem ações cotadas em bolsa, motivo pelo qual tem de ser gerida com base na Lei das Sociedades Anônimas e na Lei das Estatais.
Em vigor desde 2016, esta última lei foi criada com o objetivo de estabelecer regras claras para empresas públicas e sociedades de economia mista em matéria de governança corporativa, especialmente no que se refere à nomeação de diretores e membros do conselho de administração. A ideia era tornar a gestão mais rigorosa e transparente, para impedir interferências políticas e preservar os direitos dos acionistas minoritários.
Cumprindo o que essas leis determinam, a direção da Petrobrás tomou duas importantes medidas horas após Bolsonaro criticar o reajuste do gás. Elas foram anunciadas quando a bolsa de valores já havia encerrado as operações, para evitar alterações bruscas no valor das ações da companhia. A primeira medida foi enviar ao Ministério das Minas e Energia um ofício indagando ao governo, que é o acionista majoritário da empresa, quais são as mudanças que estão sendo cogitadas para a política de preços de gás e combustíveis. No ofício, a companhia indaga ainda se existem informações relevantes que, como manda a legislação, devem ser imediatamente comunicadas aos acionistas e ao mercado financeiro. Também com base nessa legislação, a segunda medida foi informar o teor daquele ofício à Comissão de Valores Mobiliários, que é o órgão regulador do mercado.
Quando Bolsonaro tentou obrigar a Petrobrás a reduzir o preço do diesel, desprezando as Leis das Sociedades Anônimas e das Estatais, o valor de mercado da empresa desabou, causando vultosos prejuízos aos acionistas. Agora, após ter anunciado que “não vai intervir na empresa”, mas que mandará o general Silva e Luna “mudar a política de preços lá” (sic), Bolsonaro deixou perplexo o setor privado da economia. Investidores e empresários sabem que os recursos de que o Brasil necessita para voltar a crescer só virão se a segurança do direito for mantida, eles temem os efeitos desastrosos da afronta do presidente aos padrões de governança da administração pública indireta.
O estrago que Bolsonaro vem causando não se limita apenas à interferência em política de preços da Petrobrás ou na política de pessoal do Banco do Brasil, o que levou o presidente do Conselho de Administração da instituição a se demitir há dias, em sinal de protesto. Bolsonaro também já vem questionando as diretrizes em matéria de impactos ambientais e sociais adotadas por empresas das quais a União é acionista controladora.
A modernização das leis sobre governança corporativa na administração pública indireta foi um processo complexo e difícil, que demorou anos para ser concluído. Com suas iniciativas insensatas e demagógicas, a cada interferência que faz numa sociedade de economia mista Bolsonaro destrói o que foi conquistado. Ele continua, assim, fazendo tudo o que não se espera de um governante – ou seja, afugentando financiadores, travando investimentos e minando as condições para que a economia volte a crescer quando a pandemia passar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário