SÃO PAULO A escritora Lya Luft, autora de "As Parceiras" e "Perdas e Ganhos", morreu na madrugada desta quinta-feira (30), aos 83 anos, em sua casa em Porto Alegre. Ela estava com um câncer de pele em metástase e chegou a ser internada nas últimas semanas, mas voltou para casa para as festas de fim de ano. A informação foi confirmada pela editora Record, que publica seus livros.
Nascida na cidade gaúcha de Santa Cruz do Sul em 1938, Luft se formou em pedagogia e letras na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, emendando, após a formatura, trabalhos como tradutora de obras em inglês e alemão. Entre os autores que trouxe para o português estão Virginia Woolf, Rainer Maria Rilke, Doris Lessing e Thomas Mann.
O primeiro de seus cerca de 30 livros foi "Canções de Limiar", que reuniu uma série de poemas e foi publicado em 1964. Nos anos 1970, ela lançou "Flauta Doce" e "Matéria do Cotidiano". Seu primeiro grande sucesso viria em 1980, com "As Parceiras", romance que trazia uma narradora feminina falando sobre as relações de loucura, morte e tragédia que envolvem uma família.
Na sequência veio "A Asa Esquerda do Anjo", de 1981, que ecoava o passado da autora. No livro, acompanhamos uma menina criada com rigidez por uma família alemã, que se sente obrigada a viver de acordo com as expectativas da avó, a matriarca, embora queira ser como qualquer outra criança. Como inspiração, ela tem a figura da mãe, uma forasteira que entra em choque com aquele mundo germânico ao qual não pertence.
Daí até seu primeiro best-seller, Luft escreveu ainda "O Quarto Fechado", "Exílio", "O Lado Fatal", "O Rio do Meio" e "Mar de Dentro". Até que, em 2003, lançou "Perdas e Ganhos", que vendeu quase um milhão de cópias e ficou 113 semanas no topo das listas de mais vendidos do país. A obra é uma mistura de ensaio e memória, e versa sobre amadurecimento e amargura a partir de uma perspectiva pessoal e sensível.
Com frequência Luft abordou dramas familiares e personagens que passavam por situações inquietantes em sua obra, sempre se destacando por trazer uma visão feminina a essas narrativas. Muitos dos livros foram traduzidos para diversos idiomas.
Também fazem parte de sua bibliografia títulos como "Em Outras Palavras", "O Silêncio dos Amantes", "Pensar É Transgredir", "Múltipla Escolha" e o infantil "Histórias de Bruxa Boa". Em 2013, com "O Tigre na Sombra", vendeu, novamente, mais de um milhão de cópias e foi premiada pela Academia Brasileira de Letras.
Seu último trabalho foi "As Coisas Humanas", lançado no ano passado, em que reflete sobre temas como juventude, velhice, amor, solidão, beleza, mistério e luto. A obra foi finalista do Prêmio Jabuti na categoria de crônicas e foi influenciada pela morte de um dos filhos de Luft, André, que em 2017 sofreu uma parada cardíaca enquanto surfava.
Na ocasião do lançamento, em entrevista a este jornal, ela falou ainda sobre como a pandemia de Covid-19 havia influenciado sua escrita.
"É como se o globo terrestre estivesse coberto por uma nuvem escura, meio pegajosa, se arrastando por cima de tudo. É quase incompreensível que Ásia, Europa e Brasil estejam passando pela mesma coisa [ao mesmo tempo]. Parece um grande animal, com tudo parado", disse.
Com seu estilo bastante pessoal de escrita, a autora criou o chamado "gênero Lya Luft", como editores e se referiam à sua forma de contar histórias. Neste mês, Luft foi homenageada pela Academia Rio-Grandense de Letras, que a escolheu para receber o troféu de escritor do ano oferecido anualmente pela associação.
Para além da escrita, ela continuava trabalhando como tradutora e assinava uma coluna no jornal Zero Hora. O velório será restrito aos parentes e amigos. Lya Luft deixa o marido, o também escritor Vicente de Britto Pereira, seu companheiro há 18 anos.
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