Bolsonaro encrencou com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária porque ela recomendou a vacinação das crianças. A Anvisa é presidida por um almirante-médico que ele indicou.
Ganha um fim de semana num garimpo ilegal da Amazônia quem souber qual é a utilidade pública dessa canelada, seguida por ameaças feitas aos funcionários da agência.
Ganha um lote desmatado quem for capaz de responder a qualquer uma dessas perguntas:
Qual foi a utilidade de se praticar uma diplomacia de caneladas com a China?
Que interesse tinha a diplomacia brasileira metendo-se na eleição americana e recusando-se a reconhecer a vitória de Joe Biden por 38 dias?
Que interesse essa mesma diplomacia defendia quando Bolsonaro hostilizou o candidato peronista Alberto Fernández? Ele se elegeu.
Por que Bolsonaro garantiu que o governo não compraria a vacina chinesa? Comprou.
Ganha dois lotes quem souber por que Bolsonaro disse em março de 2020 que a Covid seria uma “gripezinha”. Mais um lote para quem souber por que ele disse, em dezembro, que a pandemia estava no “finalzinho”. De lá para cá morreram mais de 400 mil brasileiros.
Qual foi o motivo da fritura de Gustavo Bebianno, o Secretário-Geral da Presidência que trabalhava pela sua candidatura ao tempo em que seus aliados cabiam numa kombi ?
Qual foi o motivo da fritura do general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz? O mesmo brinde vai para o caso da demissão do ministro da Defesa, general Fernando Azevedo.
Bolsonaro cultiva excentricidades. Sem caneladas, seriam apenas pitorescas. Afinal, do outro lado do balcão há gente que acredita que a imagem de Neil Armstrong andando na Lua em 1969 é uma fraude. Ninguém se mete em discussão por causa disso, do nióbio ou do grafeno. No caso do negacionismo sanitário, contudo, o capitão e suas falanges mostraram-se ameaçadores.
Nos últimos dias, dois generais da reserva publicaram artigos pedindo que se baixe a bola, nada além disso.
O general Santos Cruz escreveu o seguinte no jornal O Globo:
“O fanatismo sempre leva à violência e ao desrespeito. Está deteriorando e infectando relações pessoais, sociais e familiares. Está destruindo amizades por causa de governantes que não têm princípios nem compromisso com ninguém nem com nada. (…) O prejuízo ficará para famílias, instituições, amigos e o povo brasileiro… A vigarice seguirá em frente, na busca incessante da impunidade.”
No dia seguinte, foi a vez do vice-presidente Hamilton Mourão. Ele escreveu em O Estado de S. Paulo:
“A atual polarização do país extrapola a ciência política e atinge nossa rotina social. Por não sabermos lidar com a euforia própria da temática, nossas relações interpessoais acabam sendo afetadas. (…) As conversas temperadas de bom senso e gentileza terminam por ocorrer apenas entre aqueles que têm uma mesma visão do mundo e da política.”
“Todas as esferas da vida só prosperam com diálogo civilizado e construtivo. É preciso superar a agenda do confronto, do ‘eu contra você’ e ‘nós contra eles’. (…) A conversa, sem condenação prévia, sem rótulos, mas com abertura para o crescimento e soluções pacíficas, é fundamental para o avanço do Brasil, fortalecimento da democracia e resgate da paz social.”
Quem avisa inimigo não é.
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