Uma pesquisa eleitoral da Futura, encomendada pelo banco Modal, chamou a atenção na última terça-feira (25/1) por ter apresentado resultados destoantes da média da corrida ao Planalto até então. No levantamento, Lula apareceu apenas 5,5% à frente de Jair Bolsonaro. Na quinta-feira (27/1), outro levantamento, feito pelo Ipespe sob encomenda da XP, mostrou Lula com vantagem de 20% sobre Bolsonaro, resultado em linha com pesquisas anteriores de outros institutos, a exemplo de Ipec, Datafolha e Quaest. Ambos os levantamentos foram feitos por telefone. Modal e XP pertencem ao mesmo grupo, a XP Inc., que comprou o Modal no começo do mês.
O cientista político Antonio Lavareda, presidente do Conselho Científico do Ipespe, citou duas hipóteses para explicar a disparidade entre os levantamentos da Futura e do Ipespe.
A primeira é que os bolsonaristas foram superrepresentados na amostra. Isso seria demonstrado pelo resultado da resposta de voto em 2018 colhido pela Futura, se comparado ao resultado concreto da última eleição presidencial.
Disse Lavareda:
“A eleição passada, segundo o TSE, deu 39% para Bolsonaro e 32% para Haddad, arredondando os votos totais. Ou seja: uma vantagem de 7% para o Bolsonaro. A diferença mostrada nesta pesquisa do Ipespe sobre 2018 foi 45% a 36%, uma diferença de 9%. A da Futura foi 48% a 32%, isto é, uma diferença de 16%. Essa disparidade, no meu entendimento, explica bastante a diferença de números das duas pesquisas”.
Em suma, Lavareda considerou que o levantamento da Futura ouviu mais bolsonaristas do que deveria para ter uma amostra fiel ao eleitorado brasileiro — e, portanto, menos lulistas, uma vez que os outros concorrentes como Sergio Moro, Ciro Gomes e João Doria tiveram resultados semelhantes nos dois levantamentos.
“A sobrerrepresentação é tolerável até 50%. Então, a vantagem de Bolsonaro sobre Haddad em 2018 poderia ir até 11% nessas pesquisas. A da Futura foi de 16%. A diferença das duas pesquisas é sobretudo no Bolsonaro e no Lula. O Sergio Moro, o Ciro Gomes, o João Doria estão iguais, dentro da margem de erro das duas”.
O professor afirmou também que esse tipo de pergunta sobre a eleição passada serve para calibrar a amostra. Em outros países com posições políticas mais claras, disse, é possível aferir isso mais facilmente.
“O recall é um medidor político-ideológico da amostra. A amostra tem de ser representativa do ponto de vista demográfico e também das orientações político-ideológicas do eleitorado. No Brasil, não temos uma caracterização ideológica ou partidária muito clara como em outros países, como os Estados Unidos. No resto do mundo, é obrigatório você perguntar orientação ideológica e identificação partidária. No caso do Brasil, o único ponto consistente que nós temos é o voto na eleição passada”.
A segunda hipótese aventada por Lavareda também se refere à pergunta sobre o voto em 2018. De acordo com o professor, a Futura fugiu da regra e perguntou como os entrevistados votaram em 2018 antes de questionar a intenção de voto para 2022.
“Na outra pesquisa [Futura], perguntou-se o voto dos entrevistados em 2018 antes de se perguntar a intenção de voto em 2022. Há a hipótese do chamado viés de consistência. O entrevistado que diz ter votado em Jair Bolsonaro pode ficar meio inibido de na pergunta seguinte responder outro candidato”, disse Lavareda, acrescentando:
“Não conheço nenhuma outra pesquisa que faça essa questão sobre a eleição anterior antes de perguntar sobre a intenção de voto da eleição próxima.”
Procurado, o banco Modal não respondeu. Procurada, a Futura afirmou, em nota:
“O resultado encontrado pela pesquisa Modalmais/Futura Inteligência é dada pela ampla abrangência da amostra aplicada e respeito às normas que regem a elaboração e divulgação de pesquisas eleitorais”. O instituto de pesquisas também declarou: “Vale ressaltar que essa é a 7ª edição da pesquisa Modalmais/Futura Inteligência e que os resultados comparados delas têm sido muito consistentes”.
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