A desestatização da Eletrobras segue como um exemplo do que não fazer quando o governo se propõe a transferir o controle de uma empresa para investidores privados. O processo foi contaminado por interesses políticos no Congresso e agora não parece livre deles no Tribunal de Contas da União.
É esperado que o TCU acompanhe e fiscalize o uso de recursos do Orçamento, o que inclui observar a lisura das privatizações. Essa atribuição, prevista em lei, é cumprida mediante análises de um corpo técnico que está entre os mais qualificados do serviço público.
O trâmite já está na segunda etapa, e o tribunal deve se pronunciar sobre o preço da ação para a venda em Bolsa de Valores. Ocorrido na quarta-feira (20), o julgamento do tema foi suspenso após debate sobre qual seria o prazo adequado para o pedido de vista apresentado —60, 20 ou 7 dias.
Optou-se pelo período intermediário, que ainda assim se afigura acima do necessário para uma decisão dessa natureza.
É razoável imaginar que o ambiente estivesse crispado por declarações, atabalhoadas como de costume, do ministro Paulo Guedes, da Economia —que fez crítica pública a supostos telefonemas do ex-presidente e hoje presidenciável Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a ministros do TCU para barrar ou prejudicar a privatização.
Fato é que as resistências à venda da estatal —por razões ideológicas, corporativistas ou decorrentes de fisiologismo político— são bem mais amplas que as petistas, como se viu na tramitação da proposta na Câmara e no Senado.
Já no julgamento do TCU, causou estranheza que o relator Aroldo Cedraz, em seu voto, tenha proposto uma mudança no mecanismo que impede a tomada do controle da Eletrobras por um único acionista. A alteração buscava permitir que a União pudesse reestatizar a empresa, caso julgasse necessário.
O voto foi enviado aos ministros às 12h. Três horas depois, já com a sessão em curso, Cedraz anunciou que retiraria a proposição.
O dispositivo, de fato, mostrava-se mais uma intervenção de legislador que de órgão regulador. Ratificado, inviabilizaria a operação. É difícil acreditar que algum investidor pagaria bilhões de reais por um ativo correndo o risco de, a qualquer tempo, ter de devolvê-lo ao antigo controlador.
Como efeito prático do pedido de vista apresentado pelo ministro Vital do Rêgo Filho, os meses de junho e julho passam a ser apontados como os mais propícios para a venda da empresa. Atrasos maiores tornarão a operação menos provável quanto mais próxima das eleições gerais de outubro.
A despeito das obrigações impostas pelo Congresso, que implicam custos para consumidores e contribuintes, a privatização permanece desejável para ampliar a capacidade de investimento e evitar que a empresa seja utilizada no empreguismo e clientelismo político.
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