Tenho motivos de sobra para não nutrir grandes expectativas com o PT, mas minhas vivências pessoais e públicas com petistas pouco importam nesta análise. Afinal, homens de caráter duvidável e condutas antiéticas existem em todo agrupamento social.
Mas também foi no PT que conheci seres humanos em suas virtudes mais admiráveis. Homens com grandeza moral e convicções inabaláveis na possibilidade de transformar o mundo, reduzindo e eliminando desigualdades inaceitáveis. Aqueles padres anônimos com entrega absoluta a demandas sociais dos menos protegidos ou mesmo castigados por políticas programadas de exclusão, a exemplo de Pedro Casaldáliga e milhares de outros. Militantes em geral por efetivação de direitos em todas as suas dimensões individuais, sociais, como Betinho e milhares de guerreiros do bem. Indivíduos e grupos resistindo à extinção dos povos indígenas, à destruição ambiental do planeta e ao perigo nuclear iminente.
Ademais, no contexto de movimentação de um mundo com nítidos registros de retrocesso civilizatório, refleti sobre duas coisas diante das eleições que se avizinham e da necessidade de me posicionar.
Primeiramente, penso no direito de errar. Erros do PT por descontrole no pacto político de 2002, que permitiu Lula chegar ao poder ao custo de acordos desproporcionais entre redução de danos e ganhos de grandes grupos financeiros, travados com as elites mais arcaicas do país. E muitos erros meus, pegando pesado com uma crítica ampliada ao PT e das esquerdas tradicionais por excesso de pragmatismo que levou à naturalização de práticas escusas e a um certo purismo marxista de teor ortodoxo no qual o ser socialista parece distanciar-se do jogo da política e da própria sociedade.
Apaixonado que fui pelo PT desde 1981 até 2005 (ano do silêncio lulopetista para com o Mensalão), resvalei gradativamente para o terreno sempre irracional dos ressentimentos cumulativos, ao ponto de responsabilizar, unilateralmente as esquerdas pela vitória de Bolsonaro. Errar é humano. E errar a partir do pressuposto de reiterada leitura desconstrutiva sem apontar uma separação do joio e do trigo, não foi um comportamento justo para uma saída da política pequena para uma outra política. No bojo das polarizações de ambos os lados amigos angustiados questionavam o único princípio inabdicável, o fraterno.
Em segundo lugar, na política em todos os seus espaços públicos, por mais convulsos sejam esses tempos de hoje, o confronto de ideias pode até sair, deliberadamente ou por expurgo estamentais recíprocos, da busca semântica de acordos comunicacionais sobre o comum. Mas não pode se constituir como um obstáculo a mais na superação de bloqueios cognitivos substituindo diálogos válidos por trocas desclassificatórias.
Nos encontramos no fio da navalha diante da disputa entre Lula e Bolsonaro. A esperança de uma terceira via parece muito complexa na medida em que a desinformação induz narrativas, empurrando o eleitorado para a simplificação. Esta sugestiona aos lados implicados na direção da sensação de alívio por melhor perceberem o bem e o mal a não ser mais só combatido com vigor, mas eliminado definitivamente.
Admitida a complementaridade entre Lula e Bolsonaro nesse jogo que escapa diuturnamente do razoável, não se admite da mesma forma o que subjaz nos dois projetos. No que hoje Lula encarna, objetivamente, não parece mais residir alguma possível restauração de uma nomenclatura de negociatas. A militância ciente de erros inegáveis não estaria disposta a apoiar a candidatura somente por se contrapor aos autocratismo ultraconservador do governo cuja tônica é produzir intrigas, confusões, ofensas, preconceito e truculência.
Lulopetistas e democratas em geral desejam um novo modo de conduzir a política com intermediação e valorização institucional, vale dizer, dentro do Estado de Direito na República, ultrapassando os arcaísmos pré-modernos com a prática pública de lisura absoluta.
Está nas mãos de Lula esse posicionamento público. Se o fizer, interna e externamente, terá votos como o meu em outubro. Um voto não útil mas ainda de esperança libertário-emancipatória. Essa atitude ajudará a resgatar tanto uma parcela de petistas arrependidos como não arrependidos, mas desconfortáveis no voto útil. Mais que isso, ganhará eleitores entre muitos outros setores sociais inquietos com uma terceira via que não decolou, e mesmo entre bolsonaristas descontentes com os resultados pífios na economia.
– Edmundo Lima de Arruda Jr
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