A continuidade da prestação de alguns serviços essenciais está sob risco, informações e dados econômicos não estão sendo divulgados no prazo convencional, o atendimento público pode ser interrompido. Estas são algumas das consequências de uma decisão político-eleitoral do presidente Jair Bolsonaro – o aumento para servidores de carreiras ligadas à segurança, onde tem grande prestígio –, da qual talvez ele imaginasse obter apenas apoio e votos. Está colhendo, porém, a maior onda de mobilizações do funcionalismo público federal por aumentos de salários em muito tempo.
Com os vencimentos congelados há três anos, os funcionários federais – em particular os das carreiras mais bem remuneradas, que são também os mais organizados – sentiram-se preteridos com a decisão do governo de reservar R$ 1,7 bilhão no Orçamento de 2022 para aumentos salariais de servidores da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal e de carreiras ligadas ao sistema penitenciário.
Nos últimos dias, decisões de algumas categorias expuseram o descontentamento entre os funcionários federais. Servidores do Banco Central aprovaram greve na qual reivindicam reestruturação de carreira e recomposição salarial de 26,3%. Também funcionários do Tesouro Nacional, que querem reajuste de 19,9%, aprovaram paralisações. Relatórios e dados sobre o desempenho das contas públicas e das contas externas não foram divulgados no prazo usual.
Dirigentes do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (Sinal) se comprometeram a manter os serviços essenciais, como exige a lei, mas não consideram que o Pix, cujo uso é generalizado, esteja nessa classificação. No INSS, o atendimento ao público pode ser interrompido.
A pressão por aumentos salariais cresce justamente na fase considerada mais complicada de um ano eleitoral. A legislação proíbe que os vencimentos dos servidores sejam corrigidos acima da inflação seis meses antes da eleição, que está marcada para o dia 2 de outubro. Há, no governo, quem considere que o prazo para a concessão de aumentos acima da inflação termine em julho, seis meses antes do término do mandato do atual presidente.
Há, porém, margem legal para alguma correção salarial inferior à inflação durante o ano eleitoral, sem limitação de prazo. Diante da pressão crescente, o governo já estuda um aumento para todos os servidores, inclusive inativos e pensionistas, a partir de julho. Fala-se em correção de 5%, cujo custo é estimado em R$ 5 bilhões neste ano. É um enorme salto em relação ao que se projetava com o aumento limitado a funcionários de carreiras policiais. O novo ministro do Trabalho e Previdência, José Carlos Oliveira, diz que quer conceder a funcionários do INSS uma gratificação de R$ 50 por processo analisado, para reduzir a fila de pedidos de aposentadorias e pensões. Serão premiados por fazer o que já são pagos para fazer.
Em ano eleitoral, e com o governo sob pressão, parece irresistível conceder benefícios a funcionários – o problema é que, em tempo de dinheiro curto, o voluntarismo demagógico do presidente pode ser um tiro pela culatra.
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