Passados 40 anos da Guerra das Malvinas, o embate em torno do grupo de ilhas no Atlântico Sul que opôs Argentina e Reino Unido, o país vizinho ainda lida com feridas não cicatrizadas do conflito.
Para além da derrota no confronto armado, uma questão sensível para uma nação que até hoje não aceita a soberania britânica do arquipélago, nos últimos anos vem ganhando corpo um conjunto de denúncias contra militares argentinos, acusados de cometer crimes contra seus próprios comandados.
Diversas formas de tortura teriam sido praticadas contra soldados que se recusavam a combater, seja em razão da precariedade de armas e treinamento, seja devido às terríveis condições enfrentadas pela tropa, como a escassez de alimentos e de abrigo, numa região em que as temperaturas caem abaixo de 0ºC.
A lista de supostos abusos tem a marca da barbárie. Soldados amarrados seminus em árvores e deixados ao sabor das intempéries; jovens oficiais enterrados até o pescoço por dias, sem receber alimentos. Os militares são ainda acusados de terem se valido de métodos então utilizados nos centros de detenção clandestinos da ditadura argentina, como choques elétricos.
O regime militar iniciado em 1976 estava longe de constituir uma exceção no panorama político sul-americano. À época, por exemplo, Brasil, Chile e Bolívia também eram comandados por ditaduras impostas pelas Forças Armadas.
Com o conflito de 1982, os generais argentinos buscavam dar sobrevida a um regime em processo de falência, insuflando o sentimento nacionalista para unir o país. A estratégia funcionou de início. Até a esquerda, massacrada sob os militares, apoiou a trágica aventura.
A arrasadora vitória britânica, porém, desmoralizou os fardados e selou o ocaso do período autoritário, encerrado no ano seguinte.
Desde o desfecho do conflito, os poucos julgamentos sobre os abusos nas Malvinas terminaram inconclusos ou com a absolvição dos acusados. O panorama começou a mudar há cerca de 15 anos, quando juízes passaram a considerar alguns desses casos como crimes contra a humanidade.
A ação presente, que conta com cerca de 170 denúncias, está paralisada desde o ano passado, aguardando a Suprema Corte decidir se os crimes atribuídos aos militares são de lesa-humanidade —e, portanto, imprescritíveis.
Uma resposta positiva permitirá aos argentinos esmiuçar esse momento de sua história em que a estupidez da guerra se juntou às práticas abomináveis da ditadura.
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