Ricardo Galvão
Físico, foi diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe)
Ricardo Tripoli
Advogado e ambientalista, é ex-presidente da Comissão de Mudanças Climáticas do Congresso
O último relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, publicado em agosto de 2021, aponta fatos preocupantes sobre as causas e consequências do aquecimento global. E esses dados não podem ser ignorados pelos formuladores de políticas de Estado para o planejamento estratégico do país.
Nas últimas décadas, desde 1850, a temperatura média do planeta tem sido superior à da década que a precedeu. Isso está associado ao aumento da concentração de gases de efeito estufa, como o CO2, superior ao dobro da existente na Revolução Industrial. E já é mais que duas vezes a estimada nos 2 milhões de anos passados.
A não ser que seja reduzido nas próximas décadas, algo que dificilmente ocorrerá, o aumento de 1,5ºC a 2,5ºC na temperatura da Terra, entre 2040 e 2060, parece inevitável. Isso ficou evidente pelas metas dos acordos celebrados na COP26, em novembro do ano passado.
As consequências poderão até ser benéficas em algumas regiões, mas agudamente danosas em outras. Para a América do Sul, e o Brasil em particular, o cenário é ruim. Excetuando o extremo sul, ocorrerão extremos de temperatura na América do Sul.
O relatório projeta que a temperatura aumentará nos dias mais quentes, por fator duas vezes superior ao aumento da temperatura global, na região central do Brasil. A umidade diminuirá substancialmente nessa região. Apesar de cerca de 20% da água doce que flui para os oceanos seja originada no Brasil, estudo recente dos pesquisadores Augusto Getirana, Renata Libonati e Marcio Cataldi, publicado na revista Nature, em dezembro, aponta decréscimo dos reservatórios no centro-sul, o que afetará a agricultura.
Fora isso, estamos assistindo a um descontrolado e criminoso aumento do desmatamento da Amazônia, graças ao governo federal. Um dos efeitos é a diminuição do transporte da água evaporada da floresta pelos "rios voadores". Não podemos continuar inertes às ameaças do aquecimento global, "evitando olhar para o céu". O próximo governo tem que encarar o problema, utilizando o melhor do conhecimento para formular uma estratégia de desenvolvimento sustentável.
O desmatamento, acentuado pela ação do governo, tem que ser estancado. Mas só isso não basta. Precisamos de políticas de reflorestamento e de desenvolvimento. Além disso, órgãos como Ibama, ICMBio e Inpe precisam ser recuperados.
A campanha eleitoral deste ano precisa colocar a questão ambiental no centro da agenda, antes que seja tarde demais. Basta ver a última ação do presidente da República para liberar a mineração em áreas indígenas, agravando os riscos para a Amazônia.
O novo Congresso que emergir das urnas deve ter ação moralizadora para reverter os prejuízos e restabelecer normas que permitam ao país mostrar compromisso com o meio ambiente. Este é um ano decisivo para o futuro. A agenda verde é passaporte para o Brasil das próximas gerações.
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