A trama de golpe não foi para frente porque Bolsonaro se
acovardou
Bolsonaro pode
alegar que desistiu do golpe na reta final, mas não que não sabia do plano. Não
só sabia como o desejava. Temos a esse respeito o depoimento do general Freire
Gomes de que se reuniu com Bolsonaro mais de uma vez em dezembro de 2022 e
ouviu dele a proposta de ruptura. Na segunda ocasião, o
general teve de alertar Bolsonaro de que ele seria preso caso tentasse
algo nessa linha.
Sabemos também que Bolsonaro sugeriu mudanças à minuta do
decreto de GLO que deveria assinar para dar início ao plano. Quem propõe
mudanças num documento deseja usar esse documento. Bolsonaro tirou da minuta a
prisão de Rodrigo Pacheco e de Gilmar Mendes,
mas manteve a de Alexandre
de Moraes. Dado esse fato, será que ele sabia de uma operação dos
"kids pretos" para raptar Moraes no dia 15 de dezembro? Isso ainda
não está claro.
Está cada vez mais claro que a trama de
golpe não foi para frente porque Bolsonaro se acovardou. Novas mensagens
recuperadas pela polícia, agora do general
Mário Fernandes, expressam a frustração dele com a demora do líder em
assinar o decreto. Tudo indica que, com a falta de apoio dos comandantes do
Exército e da Aeronáutica e amedrontado com a chance de ser preso caso
assinasse a GLO, Bolsonaro deixou seus comparsas ao relento, deixou o poder e
foi para os EUA.
E daí chegamos ao 8 de janeiro. Ali, um golpe foi
efetivamente tentado mediante violência. O problema é que nenhuma das mensagens
e tratativas que vieram a público até agora tinha como projeto um golpe
iniciado por populares depois da transição. Em todas elas, o golpe teria que
ser dado antes da mudança de governo. Então, temos um quadro inusitado: houve
um planejamento de golpe e uma tentativa violenta de golpe. Mas o golpe
planejado não era o golpe que foi tentado.
Não que os dois sejam independentes. Um elo claro é a
participação dos "kids
pretos". Mas e os demais golpistas? Braga Netto, Mauro Cid?
Também participaram da orquestração do 8 de janeiro (escolhendo data,
organizando caravanas, encontrando financiadores, etc)? E Bolsonaro, sabia?
Isso também não está claro ainda.
Ao que tudo indica, o 8 de janeiro foi a intentona
desesperada de milhares de golpistas órfãos de Bolsonaro. Apostaram
na ideia de que "o povo" poderia tentar a ruptura. Essa ideia já
circulava em fins de 2022. Foi o que disse o coronel Jean Lawand Jr., em
conversa com Mauro Cid ainda em 1º de dezembro. Aos apelos de Lawand para que
Bolsonaro desse a ordem, Cid responde que o presidente não podia porque não
confiava no Alto Comando do Exército. Ao que Lawand retrucou: "Então
ferrou. Vai ter que ser pelo povo mesmo".
Será que a conduta de Bolsonaro se enquadra como tentativa,
"mediante violência ou grave ameaça", de golpe de Estado? Isso a
investigação e o provável julgamento dirão. Independente da esfera criminal, no
entanto, já sabemos que o ex-presidente tramou um golpe, tentou aliciar
generais e que seu círculo mais próximo falava em assassinar o opositor
vitorioso, o vice e o presidente do TSE. Assim,
pergunto a você, que votou em Bolsonaro no primeiro turno e o apoiou como
alternativa política para o país: será que ele é digno desse apoio?
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