sexta-feira, 15 de novembro de 2024

MEDOS E PÂNICOS DO BRASIL COM TRUMP

Janaína Figueiredo, O Globo

Nomeação de Marco Rubio para comandar a política externa americana foi a confirmação de um dos piores cenários imaginados para um governo Trump 2

Quando o nome do senador da Flórida Marco Rubio foi confirmado como a escolha de Donald Trump para chefiar o Departamento de Estado, a sensação no governo brasileiro foi a de que os piores cenários imaginados para um governo Trump 2 estavam se confirmando. “A cada nomeação, só piora”, comentou uma fonte diplomática, que enumerou alguns dos medos e pânicos do Brasil em relação ao republicano que se tornou líder da extrema direita global.

Os medos do governo Lula são muitos e incluem eventual sabotagem da agenda ambiental brasileira, até mesmo da COP 30, que será realizada em 2025 em Belém. O evento é uma das grandes apostas do governo em sua estratégia de inserção nos grandes debates globais, e o negacionismo climático de Trump, temem em Brasília, poderia enfraquecer o encontro.

Rubio tem péssimas relações com vários governos latino-americanos, e não só com Venezuela, Cuba e Nicarágua. A Colômbia de Gustavo Petro também está apavorada, pois o futuro secretário e Petro nunca esconderam a mútua antipatia. Para o Brasil, o governo Trump 2 pode arrastar a América Latina a um período de forte instabilidade. As pautas negativas entre Trump e a região são variadas, entre elas a imigração e provável deportação de imigrantes.

O Brasil também tem medo do impacto do conflito entre EUA e China no país e no continente. Com Trump, comentaram fontes diplomáticas, as pressões sobre o relacionamento dos países latino-americanos com a China aumentarão. O Brasil está prestes a receber o presidente chinês, Xi Jinping, que, além de participar da cúpula de chefes de Estado e governo do G20, fará uma visita oficial ao país. Para Lula, a relação com a China é central, tanto que o governo avalia a possibilidade de entrar para a Iniciativa Cinturão e Rota, a Nova Rota da Seda.

Outro medo é a utilização da chamada diplomacia coercitiva contra países da região. Um exemplo seriam medidas protecionistas em matéria de comércio, algo que preocupa profundamente o governo brasileiro, lembrando que os EUA são o segundo principal sócio comercial do Brasil, superado apenas pela China.

O papel do magnata Elon Musk no governo Trump é outro motivo de preocupação: “Com Musk, morre qualquer possibilidade de regulação das big techs”, reconheceu uma fonte do governo.

Até aqui, os medos. Mas existe o pânico, e sobre ele é pouco o que o Brasil pode fazer. Esse pânico está relacionado ao empoderamento da extrema direita regional e global, com a liderança de Trump. Um empoderamento que é visto como enorme risco para a democracia no mundo, que pode trazer violência e criar situações de tensão até mesmo dentro do Brasil, dado o vínculo de Trump com o ex-presidente Jair Bolsonaro.

O presidente da Argentina, Javier Milei, deve ser incluído nessa equação. O eixo Washington-Buenos Aires com Trump no poder provoca pânico em Brasília, onde se teme que o argentino, sentindo-se apoiado pelo novo governo americano, torne-se mais desafiante e hostil.

O fortalecimento da extrema direita tira o sono de Lula desde o primeiro dia de seu terceiro governo, quando um retorno de Trump ao poder não era considerado um cenário possível. O apoio explícito a Kamala Harris, gesto que muitos — dentro e fora do governo — questionaram, explica-se pelo pânico de Lula à expansão da extrema direita no mundo, no continente e no Brasil. O pior pesadelo do presidente brasileiro está se tornando realidade.

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