terça-feira, 31 de dezembro de 2024

FALTA DE ORÇAMENTO ESPELHA INCERTEZA FISCAL EM 2025

Editorial Folha de S. Paulo

Ano começará sem que se saibam impactos dos juros e do pífio pacote de corte de gastos; Lula perdeu margem de protelação

O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) iniciará mais um ano sem Orçamento aprovado pelo Congresso, o que é sintoma e agravante da má gestão e das incertezas que hoje cercam as finanças públicas.

O atraso reflete tanto a demora do Executivo em anunciar seu prometido pacote de contenção de gastos —que se mostrou frustrante e acelerou a alta do dólar e dos juros— como a sanha de deputados e senadores para abocanhar mais recursos públicos por meio de suas emendas.

Enquanto não fecharam acordo com o Planalto para a liberação do pagamento das emendas, os parlamentares paralisaram as votações das medidas fiscais, da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e do Orçamento.

O pacote, já tímido, foi afrouxado, não se sabe ao certo o quanto. A Fazenda, que não tem primado pela precisão de suas estimativas, calculou uma perda de R$ 2,1 bilhões, de R$ 71,9 bilhões para R$ 69,8 bilhões, na economia esperada neste ano e no próximo. Já entre analistas de mercado, a desidratação projetada ficou entre R$ 8 bilhões e R$ 20 bilhões.

A LDO —que, como o nome indica, fixa normas para a elaboração e a execução do Orçamento, incluindo a meta para o saldo das contas do Tesouro Nacional— só foi aprovada pelo Congresso em 18 de dezembro, enquanto a legislação prevê que isso deve ocorrer no primeiro semestre legislativo.

Foi com a mudança da meta para 2025, em abril, que a administração petista despertou o processo de desconfiança crescente quanto a seu compromisso com o programa de ajuste fiscal. Em vez de um superávit primário (sem contar despesas com juros) de 0,5% do PIB, cerca de R$ 60 bilhões, o governo passou a mirar resultado zero, sendo admitido um déficit de até R$ 30,9 bilhões.

A LDO incorporou ainda uma regra que gera críticas por potencialmente permitir gastos de estatais dependentes do Tesouro fora dos limites orçamentários, além de dezenas de dispositivos votados de última hora pelos congressistas, cujos impactos ainda não são sabidos ao certo.

Quanto ao Orçamento, o relator do projeto, senador Ângelo Coronel (PSD-BA), já adiantou à Folha as dificuldades que antevê para a votação no início de 2025, dado o conflito entre os Poderes provocado pelas decisões do Supremo Tribunal Federal contra o pagamento de emendas.

Apresentada no final de agosto, a peça logo despertou ceticismo em relação à grande elevação prevista das receitas. Novas dúvidas surgem agora com o choque de juros promovido pelo Banco Central, cujo objetivo é conter a inflação esfriando a economia —o que impacta a arrecadação.

O governo Lula passou quase todo o ano de 2024 semeando expectativas de providências mais ambiciosas para conter seu déficit e a escalada da dívida pública. Com o dólar acima de R$ 6, a margem para protelações se esgotou. É necessário dirimir com urgência as múltiplas dúvidas quanto às contas de 2025.

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