Às vésperas de deixar a cadeira, chefão da Câmara
arrancou uma nova estatal em Alagoas
Está perto do fim o reinado de Arthur Lira. O chefão da
Câmara passou quatro anos na cadeira. Sua gestão será lembrada pela aliança com
o bolsonarismo, pela truculência e pelo sequestro do Orçamento.
Lira mandou e desmandou como nenhum antecessor. Para apitar
sozinho, esvaziou as comissões, triturou o regimento e sufocou as vozes
divergentes. À frente de uma Casa de debates, não hesitou em cortar o microfone
e ameaçar deputados que ousaram questioná-lo
O alagoano chegou ao cargo em 2021, com apoio do então
presidente Jair Bolsonaro. Em pouco tempo, tornou-se uma espécie de
primeiro-ministro. Enquanto o capitão se dedicava a lives e motociatas, ele
tomou conta da articulação política e da pauta econômica.
Para expressar sua gratidão, engavetou mais
de 150 pedidos de impeachment. E manteve silêncio cúmplice sobre as investidas
de Bolsonaro contra a democracia, a saúde pública e o sistema eleitoral.
Lira consolidou seu poder com o orçamento secreto. Passou a
controlar a distribuição de bilhões de reais em emendas, sem transparência e
sem rastreabilidade. Em vez de procurar os ministros, os deputados passaram a
cortejá-lo em busca de verbas federais.
Ele acumulou tanta força que se reelegeu com votação
recorde. Em fevereiro de 2023, foi ungido por 464 dos 513 deputados. Rendido, o
novo governo petista nem se animou a lançar um candidato.
Pupilo de Eduardo Cunha, Lira também investiu na aliança com
o poder econômico para se firmar no cargo. Pediu a bênção ao mercado
financeiro, escancarou a porta para múltiplos lobbies e patrocinou operações
controversas, como os jabutis que favoreceram termelétricas na privatização da
Eletrobras.
No ano passado, a Polícia Federal apurou fraudes na compra
de kits de robótica por prefeituras de Alagoas. A operação apreendeu papéis com
aliados de Lira. Entre os registros, localizou uma lista de pagamentos em
espécie a um certo Arthur. O caso foi remetido ao Supremo Tribunal Federal. O
ministro Gilmar Mendes, sempre ele, anulou as provas e arquivou o inquérito.
A salvo da polícia, o chefão da Câmara espremeu o governo
Lula. Para não sabotar os projetos do Executivo, impôs a nomeação de aliados e
exigiu a chave da Caixa Econômica Federal. Às vésperas de deixar a cadeira,
apadrinhou a criação da Companhia Docas de Alagoas, já conhecida como “a
estatal do Lira”.
O episódio mostra que o Planalto errou ao apostar que o
deputado chegaria enfraquecido ao fim do reinado. Além de manter o controle do
plenário, ele deve emplacar o sucessor, Hugo Motta, com facilidade. A ver se
continuará a mandar na partilha das emendas parlamentares.
Na noite de quinta, Lira deu mais uma demonstração de poder.
Deputados de diferentes partidos, do PL ao PT, revezaram-se no microfone para
bajulá-lo. Depois de ouvir 18 discursos laudatórios, ele disse que não vê
problema em voltar ao “chão de fábrica”, mas informou estar pronto para
“qualquer outra situação”. “Nós não encerramos nenhum ciclo aqui. Sempre nos
renovamos”, avisou.
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