quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

SÍRIA, DO JÚBILO À REALIDADE

Hélio Schwartsman, Folha de S. Paulo

Quedas de ditaduras devem ser celebradas, mas é preciso estar atento para os riscos futuros

Quedas de ditaduras geram sempre justificado júbilo para os povos libertados. O regozijo, contudo, não deve nos cegar para os perigos futuros. Não foram poucas as transições que acabaram dando lugar a ditaduras até piores que a original ou a cenários de mortífera anomia.

HTS (sigla árabe para Organização para a Libertação do Levante), o grupo que parece estar no comando da Síria, até vem dando as declarações certas. Fala em organizar eleições em breve e promete respeitar direitos de todas as facções políticas e religiosas.

As origens da HTS, porém, não inspiram confiança. Trata-se de um grupo salafita e jihadista, que surgiu como um braço da Al-Qaeda de Osama bin Laden.

E, como frequentemente é o caso no Oriente Médio, o que acontece na Síria tem repercussões além de suas fronteiras. A queda da ditadura damascena representa um ônus para Moscou e Teerã, que sustentavam o regime. Ver governos autoritários e violadores de direitos humanos como são os de Putin e de Ali Khamenei perdendo força é uma boa notícia.

Mas, se houve perdedores, houve também vencedores. Aqui acabam as boas notícias. A menos que a situação mude drasticamente, saem fortalecidos na nova configuração a Arábia Saudita, outra ditadura sanguinária, ainda que vista como mais comportada no Ocidente, e o governo de Binyamin Netanyahu em Israel.

É verdade que Israel é a única democracia da região, mas é uma democracia cada vez menos funcional e que, desde o atentado terrorista do Hamas em outubro de 2023, promove uma carnificina em larga escala entre os palestinos.

Não haverá paz sustentável enquanto não for criado um Estado palestino, e a coalizão ultradireitista de Netanyahu não admite o surgimento de um. Contra todas as expectativas, o governo de Netanyahu não só sobreviveu à falha de segurança que foi o 7/10 e à guerra em Gaza como parece estar se fortalecendo após os ataques ao Hezbollah, as escaramuças com o Irã e, agora, a queda de al-Assad. Não dá para descartar que seu grupo vença a próxima eleição, o que seria trágico para a região.

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