Quedas de ditaduras devem ser celebradas, mas é preciso
estar atento para os riscos futuros
Quedas
de ditaduras geram sempre justificado júbilo para os povos libertados.
O regozijo, contudo, não deve nos cegar para os perigos futuros. Não foram
poucas as transições que acabaram dando lugar a ditaduras até piores que a
original ou a cenários de mortífera anomia.
A HTS
(sigla árabe para Organização para a Libertação do Levante), o grupo
que parece estar no comando da Síria, até vem dando as declarações certas. Fala
em organizar eleições em breve e promete respeitar direitos de todas as facções
políticas e religiosas.
As origens da HTS, porém, não inspiram
confiança. Trata-se de um grupo salafita e jihadista, que surgiu como um braço
da Al-Qaeda de Osama bin Laden.
E, como frequentemente é o caso no Oriente
Médio, o que acontece na Síria tem repercussões além de suas
fronteiras. A queda da ditadura damascena representa um ônus para Moscou e
Teerã, que sustentavam o regime. Ver governos autoritários e violadores de
direitos humanos como são os de Putin e de Ali Khamenei perdendo força é uma
boa notícia.
Mas, se houve perdedores, houve também vencedores. Aqui
acabam as boas notícias. A menos que a situação mude drasticamente, saem
fortalecidos na nova configuração a Arábia Saudita, outra ditadura sanguinária,
ainda que vista como mais comportada no Ocidente, e o governo
de Binyamin Netanyahu em Israel.
É verdade que Israel é a única democracia da região, mas é
uma democracia cada vez menos funcional e que, desde o atentado
terrorista do Hamas em
outubro de 2023, promove uma carnificina em larga escala entre os palestinos.
Não haverá paz sustentável enquanto não for criado um Estado
palestino, e a coalizão ultradireitista de Netanyahu não admite o surgimento de
um. Contra todas as expectativas, o governo de Netanyahu não só sobreviveu à
falha de segurança que foi o 7/10 e à guerra em Gaza como parece estar se
fortalecendo após os ataques ao Hezbollah, as escaramuças com o Irã e, agora, a
queda de al-Assad. Não dá para descartar que seu grupo vença a próxima eleição,
o que seria trágico para a região.
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