Reação do presidente às críticas de Kassab dá pistas
sobre estratégia para próximas eleições
Na longa entrevista
coletiva do presidente Luiz Inácio Lula da Silva há um ponto que se
destaca: a reação do governante às declarações da véspera feitas pelo
presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, que classificou o ministro da
Fazenda, Fernando Haddad, como “fraco” e disse que a oposição seria
favorita se a eleição presidencial fosse hoje.
Seria fácil para Lula se esquivar da pergunta. Lula poderia
dizer, assim como fez Haddad, que não havia tomado conhecimento das
declarações. Ninguém iria acreditar, mas seria uma sinalização de que as
declarações de Kassab não haviam sido tão importantes quanto parecem ser,
vindas de quem vêm. O presidente optou por outro caminho: chamou Kassab de
“companheiro” e disse que, ao ver a história, começou a rir. “A eleição vai ser
só daqui a dois anos”, ressaltou Lula.
O presidente prosseguiu, afirmando que
Kassab tem problemas pessoais com Haddad que prejudicam a análise. “Acho que
Kassab foi injusto com o significado do companheiro Haddad no ministério”,
disse, citando em seguida o que Kassab poderia ter visto e não viu: o
protagonismo de Haddad na aprovação da PEC da transição, da reforma tributária
e do arcabouço fiscal.
O PSD saiu fortalecido das últimas eleições municipais, mas
não teve o aval do Planalto nem para disputar a presidência da Câmara, nem para
tentar manter a presidência do Senado. Por último, Kassab viu nos últimos dias
a cota do partido na Esplanada entrar na negociação de uma provável reforma
ministerial. Ele não tem motivos políticos para estar próximo do governo
federal nesse instante.
Ao comentar as declarações, Lula optou por não tirar Kassab
do caminho do confronto, o que não passou despercebido de analistas políticos.
“Lula pagou para ver”, comenta Carlos Pereira, da FGV. Para Pereira, Kassab deu
sinalização clara de que não espera muito mais do presidente. Foi um sinal de
desesperança de uma intervenção de Lula para reequilibrar o jogo de poder de
forma mais favorável para o PSD. “Kassab ameaçou e Lula está querendo saber até
que ponto o Kassab de fato tem condições de apostar em outra candidatura. Em
última instância, Lula não vai ceder”, comentou.
Lula frisou na sua resposta que é cedo para falar de
eleição. O corolário é que é cedo também para fazer um arranjo já voltado para
construir a aliança em torno de sua reeleição. É uma tentativa do presidente de
brecar um debate sobre 2026 depois de uma pesquisa de opinião pública mostrando
que Lula está fraco nos seus redutos mais tradicionais. O próximo lance será de
Kassab.
Ao falar de economia, Lula foi dúbio. Disse que a Petrobras
tinha autonomia para aumentar o diesel, se necessário, e disse que jamais
interferiria na produção de alimentos de modo a criar um mercado paralelo. Por
outro lado negou a existência de um problema fiscal. Descartou a adoção de
novas medidas para conter gastos, no que dependesse dele.
Outro ponto importante da entrevista foi sua própria
realização. Lula afirmou que essa iniciativa irá se repetir muitas vezes, e
citou qual sua inspiração: as “mañaneras” do ex-presidente mexicano Andrés
Manuel Lopez Obrador.
As mañaneras eram entrevistas coletivas diárias dadas pelo
então presidente mexicano às seis horas da manhã. Os encontros duravam horas e
foram a principal forma de comunicação de Lopez Obrador durante seu governo
(2018-2024). Lula disse que não seguiria à risca esse modelo e é bom que seja
assim. Lopez Obrador era conhecido pela truculência ao lidar com a imprensa e
as entrevistas eram momentos de intimidação.


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