O presidente da República admitiu que o governo ainda não
entregou o que prometeu e, por isso, o povo fica insatisfeito. Disse, porém,
que vai cumprir suas promessas de campanha
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva saiu da zona de
conforto, convocou uma entrevista coletiva sem pauta preestabelecida, na qual
falou sobre quase tudo, e rebateu as críticas do presidente do PSD, Gilberto
Kassab, de que Fernando Haddad (Fazenda) é "ministro fraco" e o PT,
se as eleições fossem hoje, entraria na disputa pela reeleição "como
derrotado". A entrevista de Lula marcou uma mudança de estratégia de
marketing do governo, agora comandada pelo publicitário Sidônio Palmeira, que
assumiu a Secretaria de Comunicação Social do Palácio do Planalto.
Lula disse que "começou a rir" quando soube da
crítica feita pelo presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab. Questionado,
destacou que não adianta especular sobre o que acontecerá até 2026:
"Quando eu vi a história do companheiro Kassab, eu comecei a rir. Porque,
como ele disse que, se a eleição fosse hoje, eu perderia, quando eu olhei no
calendário e percebi que a eleição vai ser só daqui a dois anos, eu fiquei
muito despreocupado, porque hoje não tem eleição", respondeu Lula.
Kassab havia afirmado, na quarta-feira, em
evento do mercado financeiro, que "o PT não estaria na condição de
favorito, mas na condição de derrotado" nas próximas eleições. Disse
também que Haddad tem dificuldade de se impor no governo. "Ministro da
Fazenda fraco é sempre um péssimo indicativo", declarou. Lula disse que
Kassab foi "injusto com Haddad" e defendeu sua gestão na Fazenda.
Atribui as críticas a uma desavença pessoal entre os dois (o ministro da
Fazenda substituiu Kassab na Prefeitura de São Paulo), mas disse que é preciso
reconhecer os feitos de Haddad. Citou, como exemplo, a PEC da Transição e a
reforma tributária.
As entrevistas de Lula, organizadas pelo ex-ministro Paulo
Pimenta, eram engessadas: os repórteres podiam fazer apenas uma pergunta sobre
assunto previamente estabelecido. A desta quinta-feira foi uma mudança de
comportamento. Lembra postura semelhante promovida pelo jornalista Franklin
Martins, quando assumiu a Comunicação do governo Lula, em 2007, no segundo
mandato. Lula passou a falar com imprensa com muita frequência, inclusive em
entrevistas "quebra-queixo"; no jargão jornalístico, aquelas mais
tumultuadas, em que o entrevistado é literalmente cercado pelos repórteres.
Entretanto, Sidônio Palmeira ainda corre atrás do prejuízo.
Logo na largada, colheu um grande revés, com a confusão criada pela oposição
nas redes sociais por causa de uma instrução normativa da Receita Federal que
estabelecia novas regras de fiscalização do Pix, o que provocou uma crise de
imagem do governo juntos aos eleitores de baixa renda. Boatos de que o governo
cobraria impostos sobre o Pix — completamente sem fundamento, porque somente o
Congresso pode criar impostos —, aliados à inflação dos alimentos, provocaram a
queda de popularidade de Lula.
Taxa de juros
Na entrevista, o presidente da República admitiu que o
governo ainda não entregou o que prometeu e, por isso, o povo fica
insatisfeito. Disse, porém, que não vai se preocupar com as pesquisas, mas com
o cumprimento de suas promessas de campanha. A queda na popularidade abriu
espaço para a estocada que levou de Kassab. Ao rebatê-lo, Lula disse que a
economia brasileira registrou um deficit primário de 0,1% do Produto Interno
Bruto (PIB) em 2024 - próximo à meta fiscal de rombo zero prevista para o ano
passado. "A gente quer responsabilidade fiscal e menor deficit possível
porque quer que este país dê certo. Se fizer dívida, é para ativo novo que faça
este país melhor", garantiu.
Nesta quinta-feira, a Fazenda divulgou que a meta fiscal de
2024 foi cumprida. O rombo nas contas públicas em 2024 foi de R$ 43 bilhões. O
deficit primário ficou em R$ 11,03 bilhões, o equivalente a 0,09% do PIB. A
meta da equipe econômica no ano passado era de deficit zero, equilibrando
receitas e despesas. Mas o arcabouço fiscal fixa um intervalo de tolerância que
permite um rombo de até 0,25% do PIB. Ao mesmo tempo em que defendeu Haddad,
Lula reiterou que não pretende cortar gastos. "Não tem outra medida
fiscal. Se se apresentar durante o ano a necessidade de fazer, vamos reunir. Se
depender de mim, não tem outra medida fiscal", disse.
Lula não criticou a decisão do Comitê de Política Monetária
(Copom) de elevar a taxa básica de juros da economia em um ponto percentual,
passando de 12,25% para 13,25% ao ano. "O presidente do Banco Central não
pode dar um cavalo de pau num mar revolto", afirmou. "Eu tenho
certeza de que ele vai criar as condições para entregar para o povo brasileiro
uma taxa de juros menor, num tempo que a política permitir que ele faça",
completou. Arrematou com uma frase que é música para o mercado financeiro:
"No meu governo, presidente do Banco Central vai ter autonomia de
verdade".
O aumento da Selic já era esperado pelo mercado financeiro,
especialmente após o próprio BC ter sinalizado, em dezembro, que adotaria uma
postura mais rígida diante do avanço da inflação. A elevação da Selic marca a
primeira decisão do Copom sob a presidência de Gabriel Galípolo, indicado pelo
presidente Lula para comandar o BC. "Eu tenho certeza de que ele vai criar
as condições para entregar para o povo brasileiro uma taxa de juros menor, num
tempo que a política permitir que ele faça", ressaltou. "No meu
governo, presidente do Banco Central vai ter autonomia de verdade." Em
dezembro, o BC já havia sinalizado o aumento da Selic, que deve chegar a 15%,
uma das taxas de juros mais alta do mundo.


Nenhum comentário:
Postar um comentário