Em semana de reuniões do Copom e do FOMC, afloram dúvidas
sobre resiliência das instituições
Nos últimos anos ganhou reconhecimento mundial a percepção
de que as instituições importam e são fundamentais para o desenvolvimento
econômico. Ronald Coase, Douglass North, Elinor Ostrom, Oliver Williamson e, no
ano passado, Daron Acemoglu, Simon Johnson e James Robinson são alguns dos
economistas laureados pelo prêmio Nobel, cujas obras baseiam-se na demonstração
de que o conjunto de “regras do jogo” influencia o comportamento dos agentes e
afeta a qualidade e o resultado final da partida.
Garantir que os campos das pelejas sejam nivelados, cuidar
das boas condições dos gramados, exigir que todos os jogadores pratiquem o
“fair play” e proporcionar um sistema de disputa justo - tudo isso incentiva a
competição e colabora para que, ao final, os melhores vençam e o público saia
satisfeito com bons espetáculos.
Assim como nos esportes, a economia e a
política podem levar a melhores resultados quando regidas por um arcabouço
jurídico estável, que garanta iguais condições para todos os concorrentes, sem
prevalecer a lei do mais forte (seja ele o mais rico ou quem detém mais poder).
Diversos estudos mostram que, ao longo da história, as sociedades mais bem
sucedidas em criar e aprimorar instituições voltadas para o bom funcionamento
dos mercados e do sistema político tendem a prosperar mais, em termos de
geração e distribuição de renda.
No entanto, estádios padrão Fifa e sistemas de disputas por
pontos corridos não nos dão a certeza de emoção, bom futebol e nem que a melhor
equipe será campeã. Afinal, antes, durante ou depois de a bola rolar o placar
das partidas pode ser comprometido. Diferentes condições financeiras das
equipes, decisões tendenciosas dos árbitros (e até mesmo do VAR) e julgamentos
duvidosos da Justiça desportiva podem, em última instância, macular até mesmo o
resultado de todo o campeonato.
Instituições, portanto, importam, mas o comportamento dos
agentes que as conduzem pode prejudicar a entrega daquilo que se espera delas.
No campo do combate à inflação, por exemplo, embora o controle da emissão de
moeda pelos Estados nacionais venha de tempos imemoriais, foi somente a partir
do século passado que se tornou dominante a visão de atribuir a um banco
central a missão de zelar pela estabilidade dos preços.
Posteriormente, muitos países apostaram que blindar as
decisões da autoridade monetária da influência política (e, de certo modo,
também dos agentes do mercado) tende a contribuir para a manutenção do poder de
compra da população. Foi assim que diversos aprimoramentos institucionais foram
adotados, como mandatos para os dirigentes dos bancos centrais, autonomia
orçamentária, quadro próprio de funcionários, entre outras medidas.
O Fed (Federal Reserve), banco central americano, foi
fundado em 1913 e desde 1935 seus sete diretores exercem mandatos de quatorze
anos, sendo que as decisões sobre política monetária são tomadas num comitê (o
Federal Open Market Committee - FOMC) que tem também a participação de cinco
representantes das sucursais do órgão nos Estados. O presidente do FOMC tem
mandato de quatro anos e o atual ocupante, Jerome Powell, pode ficar no cargo
até 15 de maio de 2026.
Por aqui, nosso Banco Central é bem mais recente (1964) e a
previsão de mandatos para seu presidente e seus oito diretores, que também são
responsáveis pelo Comitê de Política Monetária (Copom), só foi aprovada em
2021.
Por uma coincidência do calendário econômico e político, as
reuniões do FOMC e do Copom desta semana serão acompanhadas como uma rodada
decisiva de um campeonato de futebol. Em jogo está a própria independência das
duas instituições e sua capacidade de trazer a inflação para dentro da meta nos
próximos anos.
No caso do Brasil, os olhos estarão voltados para o
comportamento de Gabriel Galípolo em sua primeira atuação como presidente do
Banco Central. Pelas regras atuais, Lula contará daqui até o final de seu
terceiro mandato com uma diretoria do Bacen nomeada em sua maioria (7 dos 9
membros) por ele, o que levanta dúvidas sobre o grau de liberdade que o Copom
terá para combater a inflação num cenário adverso, enquanto as eleições de 2026
se aproximam a passos largos.
Já nos Estados Unidos, as preocupações se situam a algumas
quadras da esquina da 20th Street com a Constitution Avenue, onde os diretores
do Fed se reunirão na terça e na quarta-feira. Depois que o recém-empossado
Donald Trump fez declarações contra as elevadas taxas de juros no Salão Oval da
Casa Branca e no seu discurso no Fórum Econômico Mundial em Davos, tornou-se
evidente que a autoridade monetária também está no radar das investidas do novo
presidente contra as instituições americanas.
Como um típico cartola do futebol brasileiro da década de
1980, daqueles que invadiam o campo para contestar decisões dos árbitros e
tentavam reverter no tapetão os resultados das partidas, Donald Trump não
hesitará em exercer sua força e poder contra todos os que se colocarem contra
seus planos imperiais de “fazer a América grande de novo”.
As próximas rodadas têm tudo para ser emocionantes, embora
não pela qualidade do jogo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário