Se Trump fizer tudo o que anunciou, haverá um enorme
tumulto na economia, dada a esperada reação dos países punidos
O Panamá é um
país pequeno, de 4,5 milhões de habitantes, PIB modesto de
US$ 84 bilhões. A moeda corrente lá é o dólar americano. Não tem Exército,
apenas forças policiais. E uma riqueza preciosa, o canal de 82km que liga o
Pacífico e o Atlântico — rota essencial para o comércio global.
De outro lado, os Estados Unidos,
superpotência com 1,5 milhão de soldados nas Forças Armadas. E, desde o dia 20,
um presidente classificado pela revista The Economist como imperialista no
comando de uma Presidência imperial, Donald Trump. Pois esse presidente, no
solene discurso de posse, afirmou:
— Vamos tomar de volta o Canal do Panamá.
Questionado a respeito, o presidente panamenho, José Raúl
Mulino, tratou de desclassificar a ameaça:
— Fala sério! — respondeu, tentando parecer irônico.
Muitos analistas já mostraram um dos
estilos preferidos de Trump: ameaçar, introduzir propostas absurdas, então
negociar e cantar vitória. Se for o caso, ele exigirá do governo panamenho
tratamento privilegiado aos navios americanos: tarifas menores, direito
preferencial de passagem, vantagens em relação a todos os outros. É o que se
deduz das suas queixas. Diz que o Canal é controlado pelos chineses (falso) e
que os navios americanos são prejudicados (falso também).
Mas, como a verdade não é um critério válido para Trump, não
adiantará nada Mulino argumentar que os navios de todas as bandeiras têm
tratamento igual e que essa é a atitude comercial correta. Trump quer vantagens
e, se quiser mesmo, toma o Canal em um dia de operação militar. Então, como
fica Mulino quando conversar, na semana próxima, com o secretário de Estado dos
Estados Unidos, Marco Rubio?
É mais ou menos essa a sensação de todos os governantes que,
mais dia, menos dia, terão de se acertar com Trump. Não apenas nas questões
territoriais, mas sobretudo nas políticas e econômicas. Tarifas de importação,
por exemplo. Trump disparou várias ameaças: cobrar 25% dos produtos importados
de México e Canadá, 60% dos chineses e nada menos que 100% dos países do Brics,
caso insistam em tentar escapar da órbita americana e do “poderoso dólar”.
Neste ano, o Brasil exerce a presidência do Brics. A
diplomacia do presidente Lula tem
tentado justamente fortalecer o Sul Global e incentivar os países do grupo a
fazer trocas comerciais em moedas locais. A China está no
Brics. E tem sido alvo de sinais contraditórios. Num momento, Trump trata os
chineses como ameaça. Depois, convida Xi Jinping, para a posse e declara ter
boas relações com ele. A Rússia também integra o Brics — e foi alvo de uma
ameaça nova: ou faz a paz com a Ucrânia, ou também será punida com tarifas de
importação e outras restrições.
Como Trump também afirmou que taxará os produtos dos aliados
europeus, governantes mundo afora ficam no dilema: o que é sério? O que é “só”
ameaça? Onde está o ponto de negociação? Não é um dilema tão crucial quanto o
do presidente Mulino — serei ou não invadido? —, mas é grave.
Se Trump fizer tudo o que anunciou, haverá enorme tumulto na
economia mundial, dada a esperada reação dos países punidos. Comércio global
travado, em meio a uma guerra de tarifas e restrições de todas as partes,
provocará inflação e baixo crescimento, se não recessão. Os mercados se
prepararam para o pior. Se tarifas e protecionismo geram inflação nos Estados
Unidos, isso significa que o Fed, o banco central, não poderá mais reduzir a
taxa básica de juros. Juros altos nos Estados Unidos fortalecem o dólar e,
pois, enfraquecem as demais moedas.
Mas, como as tarifas não saíram de imediato, o mercado
aliviou. Moedas emergentes, inclusive o real, se fortaleceram. Para complicar,
saiu outra ameaça. Trump disse que “exigirá” a queda dos juros. O presidente do
Fed, Jerome Powell, comentou:
— O presidente dos Estados Unidos não tem o poder legal de
demitir o presidente do Fed.
Este é o ponto: como serão contidas as ameaças de Trump,
dentro e fora dos Estados Unidos? Serão?
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