Fui instigado a escrever sobre os 40 anos da vitória de
Tancredo Neves no Colégio Eleitoral. Aos leitores que agora estão se dando
conta que a Ditadura Militar (1964 – 1985) não foi branda nem com aqueles que
lhe faziam uma oposição pelas vias institucionais por conta do merecido sucesso
do filme Ainda estou aqui, recomendo a leitura do breve artigo de
Pablo Spinelli, “1974: a derrota vitoriosa”¹ para que se contextualize melhor
um cenário que vai da abertura democrática até a Constituinte (1987/1988).
Muitas pessoas bem intencionadas ou desconhecedoras da
história política brasileira assumem posturas que renegam a importância do
centro político nas conquistas democráticas. Atribuem os atalhos como o melhor
caminho, mas, em política, muitas das vezes seria a forma de abreviar a queda
num precipício. O Brasil atravessava uma forte recessão econômica com taxas
elevadas de inflação em 1983 (164,01%), 1984 (215,26%) e 1985 (242,23%). Essa
era uma das heranças do autoritarismo brasileiro que nos permitiu modernizar
com uma espiral de desigualdade social e a estabilidade econômica conciliada a
um Estado de Bem Estar Social no arcabouço da Carta de 1988 é fruto dessa
“engenharia política” conciliadora.
Foi Tancredo Neves um político moderado e
de centro que melhor expressou as condições para conciliar as forças
democráticas com os dissidentes do antigo regime (a Frente Liberal) e propôs um
ex-presidente do partido da ARENA/PDS como seu companheiro de chapa. A lição
política do entendimento para nos permitir o encerramento da ditadura por meio
de uma eleição indireta através de amplos comícios em todo o país. Esse é o
momento de relembrar os ex-deputados Airton Soares, Bete Mendes e José Eudes
que entenderam a grandeza daquele momento político e não se ausentaram do
Colégio Eleitoral.
Uma “onda” de redemocratização esteve rondando o Cone Sul em
1985. Argentina, Brasil e Uruguai ingressavam em um processo de transição
democrática que os limites de espaço não nos permite aqui detalhar. Para a
rápida localização de nossos leitores o Uruguai de Pepe Mujica e a Frente Ampla
naquele instante se abriu a democratização com Julio Maria Sanguinetti eleito
na sequência do “Pacto do Clube Naval”. No caso da Argentina, a eleição de Raúl
Alfonsín em 1983 foi sob o impacto da derrota na “Guerra das Malvinas”, ou
seja, as FFAA estavam muito enfraquecidas o que permitiu os eventos que se vê
no filme Argentina: 1985.
Ainda lemos lideranças políticas do “campo progressista” a
desdenhar nossa democracia como se fosse “falsa” por conta de seus contrates,
mas é essa a natureza da prática desse regime que a sua imperfeição é sua
melhor qualidade. Não podemos alimentar esse “negacionismo político” uma vez
que só está a reforçar o discurso “anti-sistema”. Então, muito vagar com essas
posturas sectárias que nos faz ver apenas o “Centrão” no meio político entre
uma distorcida polarização política.
Devemos reconhecer que o Brasil de 1985 nos deixou um legado
de conciliação que faltou em outras partes do mundo como o fim da URSS ou nos
conflitos do Afeganistão, da ex-Iugoslávia e Iraque. O destino da conciliação é
uma característica que herdamos de nossa formação do legado ibérico, portanto
nossa história política e social incomoda aqueles que desejam reconhecimento
das fraturas para aprofunda-las. Seriam filhos de Paulo Prado que
escreveu Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira.
Lembrai-vos da personagem Eunice Paiva ao estimular que
iriam sorrir para a fotografia. O sorriso de Eunice se encontrou/conciliou com
o sorriso de Tancredo Neves em 15 de janeiro de 1985.
¹ – Ver
https://votopositivo-cg.blogspot.com/2024/07/boletim-brasilia-conection-bbc-051-1974.html.
Acessado em 15 de janeiro de 2025.
*Vagner Gomes de Souza é doutorando no PPGCP-UNIRIO.
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