segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

SOB AS GARRAS DO CONSERVADORISMO

Ana Cristina Rosa, Folha de S. Paulo

O comprometimento com diversidade e inclusão mostrou-se sujeito a pressões políticas e tendências do mercado

Reconhecimento, justiça e desenvolvimento são os pilares da Segunda Década Internacional para os Afrodescendentes (2025-2034), reeditada pela Assembleia geral das Nações Unidas, em dezembro, para promover a efetividade de direitos humanos.

Receio que a iniciativa esteja fadada ao fracasso. Não só porque uma década (ou duas, no caso) é pouco para deslindar o trágico legado dos séculos de escravização africana. Mas também porque as principais causas da insuficiência da Primeira Década (2015-2024) —falta de investimentos, baixo incentivo institucional e pouco compromisso— não foram resolvidas.

Para completar, o comprometimento com diversidade, equidade e inclusão mostrou-se sujeito a pressões políticas e tendências do mercado. E o cenário global mudou. Nos Estados Unidos, por exemplo, o retrocesso nos chamados programas DEI (de diversidade, equidade e inclusão) cresceu desde que a Suprema Corte (de maioria conservadora) proibiu, em 2023, o uso de critérios raciais em processos de admissão acadêmica. Na Universidade Harvard, a decisão resultou no menor número de alunos negros matriculadas na faculdade de direito desde o Movimento pelos Direitos Civis, na década de 1960.

A iminência do governo Trump também alimenta a ideia equivocada de que ter sucesso depende só de esforço individual, desconsiderando a importância das ações afirmativas para reparar injustiças e combater desigualdades históricas.

Nesse sentido, nos últimos dias a Meta (empresa dona do Instagram, Threads e Facebook) anunciou o fim de ações de diversidade, equidade e inclusão, e o McDonald’s noticiou a reversão de práticas voltadas à diversidade nos EUA, por exemplo.

Na prática, o que temos em lugar do reconhecimento é a desconsideração da herança africana. Onde deveria prevalecer a justiça, há discriminação. E a desigualdade vigora sobre o desenvolvimento (que implica oferta de oportunidades). É difícil acreditar no êxito de qualquer iniciativa para promover equidade e justiça racial sem o engajamento das empresas.

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