O maior problema enfrentado pelo governo reside na
dificuldade do presidente em compreender a necessidade de se fazer um ajuste
fiscal que permita colocar as contas públicas em reta de sustentabilidade
"Quem não se comunica se trumbica". Essa frase
famosa é de autoria de um dos maiores comunicadores populares do Brasil, José
Abelardo Barbosa de Medeiros — Chacrinha. Referência para publicitários e
comunicadores em geral, o apresentador, falecido em 1988, revolucionou a
linguagem radiofônica e televisiva em seus mais de 50 anos de carreira.
Quem, atualmente, tem menos de 37 anos de idade não pode
conviver com ele, mas pode conhecer um pouco desse verdadeiro gênio vendo
vídeos disponíveis na internet. Também vale muito a pena assistir ao belo filme
de 2018 intitulado "Chacrinha: O Velho Guerreiro", estrelado por
Eduardo Sterblitch, que interpreta o personagem na juventude, e pelo grande
Stepan Nercessian.
Desde meados de dezembro, o tema
comunicação foi um dos mais presentes na mídia e nas redes sociais. Tudo porque
o presidente Lula, diante das dificuldades apontadas pelas pesquisas, resolveu
colocar a responsabilidade na forma, segundo ele, pouco eficaz como o governo
se comunicava com a sociedade. E, após quase um mês de especulações, em 14 de
janeiro, Sidônio Palmeira tomou posse como Ministro da Secretaria de
Comunicação (Secom).
Sua chegada ao governo foi cercada das melhores
expectativas. Afinal, é um profissional de reconhecida competência no mundo da
publicidade e com longa trajetória de sucesso em trabalhos de assessoria em
campanhas eleitorais. Diga-se de passagem, ele compartilhava do mesmo
diagnóstico.
Só que o "buraco é mais embaixo". O maior problema
enfrentado pelo governo reside na dificuldade do presidente em compreender a
necessidade de se fazer um ajuste fiscal que permita colocar as contas públicas
em reta de sustentabilidade, premissa para poder reverter a curva de
crescimento inflacionário, o imposto mais danoso para a população de baixa
renda.
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA)
chegou a 4,83% no acumulado dos 12 meses de 2024. O percentual está acima do
teto do limite da meta de inflação determinada pelo Conselho Monetário Nacional
(CMN) para o ano, que era de 4,5%. Isso, por si só, já é um problema.
Porém, não existe nada tão ruim que não possa piorar. Quando
se considera só a inflação de alimentação em casa, a taxa brasileira no ano
passado foi de 8,23%. E em sete capitais — Belém, Belo Horizonte, Campo Grande,
Goiânia, Rio Branco, Rio de Janeiro, São Luiz e São Paulo — o percentual foi
ainda superior.
Como o governo avalia que o problema central está na
comunicação, o presidente Lula recentemente gravou um vídeo visitando a horta
da granja do Torto, onde procurou explicar as razões do aumento dos preços dos
alimentos e, diferente de sua habitual e competente forma de se comunicar, fez
uso de um tom quase professoral. Ora, em política, toda vez que se precisa
explicar muito alguma decisão ou posicionamento trata-se de um mau começo. O
que a população, particularmente a parcela mais pobre, espera do poder público
são medidas que gerem os resultados desejados. No caso em tela, a reversão da
alta inflacionária. Qualquer atitude diferente disso é um tiro n´água.
E aí, mais uma vez, o governo prefere fugir de sua
responsabilidade com o equilíbrio das contas públicas para buscar soluções tão
mirabolantes quanto ineficazes. O ministro da Casa Civil chegou a sugerir que
as pessoas substituíssem a laranja por outra fruta! Nesta semana, um dos
vice-líderes do governo no Congresso propôs que seja criada uma espécie de
farmácia popular de comida.
Por mais que os indicadores macroeconômicos, como o
crescimento do PIB e redução do desemprego, estejam sendo positivos, o aumento
da inflação com impacto direto nos preços das mercadorias e no poder de compra
da população faz com que uma parcela significativa das pessoas venha
apresentando seu descontentamento, como apontam diversas pesquisas recentes. Na
verdade, percebe-se um sentimento de impaciência crescente provocada pela
frustração depois dos dois primeiros anos de um governo eleito prometendo que as
pessoas voltariam a ter comida farta no prato.
Não bastassem essas dificuldades, o presidente, na primeira
reunião ministerial do ano, resolveu antecipar o calendário eleitoral,
afirmando que "o que eu quero dizer para vocês é que 2026 já
começou". Considerando que ele sempre se notabilizou por um instinto
político poderoso, tal declaração feita por quem está no meio do mandato causou
estranheza. Alguns analistas interpretaram como um sinal de insegurança ou
fraqueza. Outros preferiram creditar à conhecida esperteza. Só não se pode
esquecer o ditado "esperteza, quando é muita, come o dono".
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