O dilema de Lula: olhar para a humanidade ou defender o
eleitor?
O presidente Lula tem a chance de levar para a COP30, em
Belém, metas ambiciosas para uma economia mundial sem combustíveis fósseis e a
inclusão de compromisso com a educação para mudar a base da crise ambiental, em
frágil equilíbrio pressionado pela voracidade por consumo e ganância por lucro.
O problema: terá de optar entre a moral para cuidar da humanidade e a política
para atender aos eleitores locais. A exploração de petróleo provoca
desequilíbrios ecológicos, mas a população quer produção de petróleo na
“Amazônia Azul”. Apesar da nomeação de André Corrêa do Lago e de Marina Silva,
Lula perderá força moral se optar pela política e autorizar a Petrobras a fazer
as pesquisas para aumentar, em vez de reduzir, a produção de petróleo. O
eleitor não vota por barrar o aumento do nível do mar daqui a vinte anos, quer
mais petróleo que permita reduzir o preço da gasolina.
Trump é coerente quando adota o lema
“perfurem onde puder”, porque é um populista sem preocupação moral. Lula será
incoerente por ter discurso moral pela humanidade no longo prazo e agir como
político olhando para eleições locais. Ainda mais grave, o americano apenas
incentiva que indivíduos explorem petróleo, enquanto no Brasil quem perfura e
explora é a empresa do governo. Lula tem conseguido driblar o choque entre
moral e política, mas agora terá de optar.
“Trump é coerente quando adota o lema “perfurem onde
puder”, porque é um populista”
A questão moral não se limita a evitar
vazamento de petróleo no litoral, mas implica impedir o impacto nocivo de suas
emissões na atmosfera. O argumento de que autoriza apenas a pesquisa é uma
falácia que significaria sacrificar a Petrobras e desperdiçar bilhões de
dólares. Dizer que vai usar o dinheiro ganho com a poluição fóssil para fazer a
transição à energia limpa e sustentável é como investir em fábrica de armas
para financiar a paz. Há outros nós: argumentar que devemos explorar petróleo
na Amazônia porque a Guiana está ficando rica ao explorar seu petróleo na
região é o mesmo que defender enriquecer assaltando quem passa na rua porque
nosso vizinho faz isso. Há incoerência no raciocínio do governo.
Quando decidiu usar a bomba atômica em Hiroshima, em 1945, o
presidente dos Estados Unidos Harry Truman fez opção política correta, mas
sobejamente imoral: acabou a guerra, eis o ponto positivo, e atendeu aos
interesses de seus eleitores, mas ficou com a marca da imoralidade contra a
humanidade, em marco até hoje indelével. O presidente Lula perderá força moral
no mundo se, antes de novembro, no encontro de Belém, puser a opção política
eleitoral nacional acima da opção ética de longo prazo pela humanidade. No
entanto, se deixar a decisão para depois da COP30, ficará com a imagem de que
ludibriou o mundo, vai macular sua liderança de estadista planetário e
comprometerá a imagem de Marina Silva como
símbolo mundial da luta por um novo progresso, limpo, verde, sustentável, sem
os trágicos efeitos do uso do combustível fóssil.
O Brasil precisa chegar à COP30 com autoridade moral e
propostas ambiciosas para a descarbonização da economia, e a defensa de um
imenso programa global pela educação de base de todas as crianças do planeta
para criar uma nova mentalidade que defina um novo tipo de progresso, não
tóxico, sem o carbono químico e sem o carbono mental: a avidez consumista e a
cobiça por lucro.
Publicado em VEJA de 7 de março de 2025, edição nº 2934
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