Na implantação das políticas públicas de saúde, simplismo e
imediatismo desenham o caminho mais curto para o fracasso. O SUS, nascido do
pacto democrático materializado na Constituição de 1988, tem uma bússola
estratégica correta, uma arquitetura institucional sólida e uma base teórica
robusta. Sua trajetória histórica é marcada por avanços inquestionáveis. O
enfrentamento da pandemia do coronavírus foi seu último grande teste. No
entanto, trinta e sete anos após o lançamento de sua pedra fundamental, o sistema
nacional de saúde ainda possui lacunas visíveis no tocante ao investimento
público per capita insuficiente (1/4 da média dos países da OCDE), às
falhas de gestão, na construção das redes assistenciais integradas, e na
formação de seus recursos humanos.
Fui secretário de saúde de MG (2003/2010), presidente do
CONASS (2005/2006) e titular da Comissão de Seguridade Social e Saúde da Câmara
dos Deputados (2011/2018), quando conheci o SUS por dentro, sua complexidade,
seus desafios e limitações.
Prefeitos, governadores e presidentes da
República, quando não são do ramo, tendem a ficar ansiosos por resultados
imediatos e visíveis. Dificilmente compreendem a articulação interfederativa do
SUS e o papel de cada um. Tendem a querer medidas unilaterais e heróicas, em
geral, fadadas ao insucesso. Politicamente, na maioria das vezes, ônus e bônus
são compartilhados entre as três esferas de governo. O SUS construiu a melhor
política pública nacional setorial integrada, tanto que serve de exemplo para assistência
social, segurança pública e educação.
O presidente Lula demitiu a ministra Nísia Trindade
frustrado com os resultados colhidos em relação à cobertura vacinal e ao
programa intitulado MAIS ESPECIALISTAS (atenção secundária)). A ministra é uma
intelectual respeitada, mas já corria nos bastidores de Brasília que não tinha
vocação gerencial.
O bom gestor de saúde tem que planejar, liderar, agir para
entregar cinco coisas básicas à população: as melhores políticas de assistência
farmacêutica (oferta de medicamentos) e de vigilância em saúde (prevenção,
imunização, promoção da saúde, combate às endemias) possíveis e, por outro
lado, uma rede assistencial integrada com uma boa atenção primária
(estratégia da saúde da família), acesso à uma qualificada atenção secundária
(especialistas e exames de imagem e laboratórios) e uma retaguarda terciária forte
para internações, cirurgias e tratamentos (hospitais, inclusive urgência e
emergência). Para cada um dos cinco desafios, uma resposta a ser construída em
parceria pelos três níveis de governo, com uma divisão de trabalho pactuada.
Tudo trabalhoso e com resultados a médio e longo prazo.
A ministra Nísia por mais competente não conseguiria ampliar
a cobertura vacinal e o acesso à atenção secundária sem a forte cooperação de
estados e municípios. Toda vez que o governo federal tentou atropelar, por
ansiedade, voluntarismo e preocupação com a geração de marca própria, não houve
êxito pleno e duplicamos meios num ambiente de escassez. No passado, a
implantação de UPAs foi um desses casos. Na atenção secundária, não tenho a
menor dúvida que a melhor resposta são os consórcios intermunicipais de saúde
apoiados por vigoroso sistema regional de transporte sanitário.
Na saúde, visão larga, paciência e caldo de galinha nunca
fizeram mal a ninguém!
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